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INACREDITÁVEL
Oficiais de Justiça demoraram quase quatro anos
para notificar o ex-presidente Fernando Collor

Aos 47 anos, Rosane Malta é uma mulher decidida a reconstruir a própria vida. Desde que se separou do ex-presidente Fernando Collor, a primeira-dama do impeachment vive uma verdadeira saga. Em busca de uma pensão alimentícia determinada pela Justiça e do direito de dividir com Collor parte do patrimônio milionário acumulado durante o casamento, Rosane moveu, em 2008, duas ações contra o ex-marido. Mas a partir daí começou a provar o gosto amargo de ser adversária do poderoso senador por Alagoas. Advogados abandonaram seu processo sem maiores explicações, magistrados protelaram o desfecho do caso e depois se declararam impedidos de prosseguir com o trabalho e agora o Tribunal de Justiça demora a indicar um substituto para a juíza Nirvana Coelho, a última a desistir da ação. O drama vivido pela ex-primeira-dama é um retrato da influência política na terra dos marechais. “Aqui acontecem coisas muito estranhas, difíceis de acreditar. O Fernando controla tudo de uma forma assustadora. E ninguém tem coragem de enfrentá-lo”, diz Rosane.

A reclamação de Rosane Malta tem razão de ser. Há um ano a Justiça determinou que, na divisão de bens, ela teria direito a dois apartamentos e dois carros de luxo ou a uma indenização estimada em R$ 900 mil. Collor recorreu e o processo parou. Em outra frente, a ex-primeira-dama luta por quase dois anos de pensão alimentícia atrasada e calcula que deveria receber perto de R$ 290 mil. Como se sabe, pensão atrasada é problema sério para um cidadão comum. Mas com Collor tudo é diferente. Os oficiais de Justiça em Alagoas passaram três anos e dez meses sem notificar o atual senador, alegando que ele não estava sendo encontrado. Deram essa justificativa, embora Collor tenha endereço certo, casa de praia e cumpra expediente no Senado da República, onde preside uma comissão permanente.

A situação só mudou na quinta-feira 22 de março, quando uma oficial de Justiça de Brasília conseguiu a assinatura de Collor no processo. A ação finalmente pôde ser retomada. Depois de despistar a oficial por seis vezes, Collor decidiu receber a citação porque, segundo pessoas ligadas ao senador, integrantes do Judiciário alagoano pediram a ele que o fizesse. O argumento era de que a protelação estava se tornando pública e deixava toda a magistratura daquele Estado sob suspeita de favorecimento.

Collor assinou, mas não parece disposto a cumprir a decisão. Já mudou de advogados e se prepara para recorrer e protelar o fim da ação. “Mas agora sabemos como as coisas funcionam. Por isso, vamos pegar o processo que está em Brasília e levá-lo pessoalmente para Maceió”, conta o advogado de Rosane, Weider Rodrigues.

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POMO DA DISCÓRDIA
Briga judicial envolve apartamento de Collor na praia de Jatiúca, em Maceió

Enquanto aguarda o desfecho das ações contra Fernando Collor, Rosane Malta segue fazendo planos. Quer virar empresária e começar a trabalhar. “Há um talento dentro de mim que não foi usado porque passei a vida somente acompanhando o Fernando”, diz. Rosane também pretende retomar a vida amorosa depois que deixar a mansão onde vive sozinha cercada por seguranças pagos pelo ex-presidente. “Ainda estou nessa casa porque se eu sair ele pode tomá-la de mim e me deixar até sem um lugar para morar. Mas quero me mudar para um apartamento sem lembranças do passado, que tenha a minha cara. Aqui fica difícil até encontrar um namorado”, planeja. Rosane diz que tem medo de viver na mansão e que não se sente confortável com o fato de os seguranças e o motorista que a servem serem escolhidos pelo ex-marido, com quem ela não fala há sete anos. “Não me sinto segura com essa situação. Por isso, sempre digo que se algo acontecer comigo a responsabilidade é dele”, diz.

A ex-primeira-dama do Brasil tornou-se evangélica e hoje passa os dias entre a academia, os cultos e as obras de caridade ligadas à igreja que frequenta. Segundo ela, a proximidade com a religião salvou sua vida. “Todo mundo sabe que quem se meteu no caminho do Fernando morreu. Vivas só restamos eu e a Cecília, que era macumbeira dele. Para mim, está claro que fui salva por Deus graças à minha proximidade com os evangélicos”, analisa ela. Uma vez por semana, ela organiza encontros com pastores e amigos na mansão onde mora.

Com uma vida que nem de longe lembra os luxos do tempo em que se dividia entre Miami, a Casa da Dinda e o Palácio da Alvorada, Rosane teve que aprender a fazer as contas na ponta do lápis e a viver com recursos que vão encurtando no fim do mês. Ela diz que já superou o pior e que agora dedica suas orações a pedir que o ex-marido cumpra as decisões judiciais que a favorecem. “Será minha chance de começar uma vida nova. Só quero o que a Justiça considerou meu direito. Nada mais.” O problema é que para reconstruir a vida ela terá de contar com a honestidade, a coragem e o empenho do Judiciário de Alagoas. Sua saga não parece estar perto do fim. 

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