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Em carta enviada à sede da Federação Internacional de Futebol, em Lausanne, na Suíça, o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, comunicou oficialmente nesta segunda-feira (5) à entidade máxima do futebol que o governo brasileiro não aceita mais o secretário-geral Jérôme Valcke como interlocutor para tratar da organização da Copa do Mundo de 2014. No documento, dirigido ao presidente da Fifa, Joseph Blatter, Rebelo oficializa o rompimento com o dirigente e faz o pedido para que um novo interlocutor seja escolhido.

A ofensiva do governo brasileiro ocorre após Valcke ter ao dizer que os organizadores da Copa-2014 precisavam de um "chute no traseiro" para conseguir viabilizar a tempo a infraestrutura para realizar o Mundial de 2014. Apesar da insatisfação do governo brasileiro com as pressões feitas por toda a entidade, a carta ressalta que o rompimento é exclusivamente com Valcke.

"Recebemos com espanto as inapropriadas declarações do senhor Jérôme Valcke. A forma e o conteúdo das declarações escapam aos padrões aceitáveis de convivência harmônica entre um país soberano como o Brasil e uma organização internacional centenária como a Fifa", escreveu Aldo Rebelo na carta enviada à Fifa.

"Diante desta realidade, o governo brasileiro não pode mais aceitar nas suas tratativas com a Fifa o senhor Jérôme Valcke como interlocutor durante a preparação desse mundial. Estamos empenhados e confiantes na construção de uma grande Copa", completou o ministro.

Na última semana, a Comissão Especial que discute a Lei Geral da Copa havia aprovado relatório em que ficava garantida a meia-entrada para idosos durante o Mundial e em que se estabelecia que a Copa do Mundo de 2014 teria disponíveis 300 mil ingressos a serem destinados à chamada categoria 4, setor dos estádios onde o público terá direito a bilhetes a preços populares, na casa dos US$ 50. Por um erro regimental, no entanto, o texto precisará ser votado novamente.

Pela proposta do relator, Vicente Cândido (PT-SP), a categoria 4 deverá ser ofertada unicamente a brasileiros residentes no País, com prioridade para idosos (mais de 60 anos), estudantes e participantes de programas federais de transferência de renda, como o Bolsa Família. No caso de mais de 300 mil torcedores disputarem a cota de ingressos populares, caberia à Fifa promover um sorteio para definir aqueles que terão direito às entradas mais baratas.

Entenda a polêmica

Em entrevista concedida na sexta-feira (02), o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, disse que os organizadores do Mundial de 2014 precisavam de um "pontapé na bunda" para as obras da Copa do Mundo andarem no País, e afirmou que os preparativos brasileiros estão em "estado crítico".

"As coisas não estão funcionando no Brasil. Muitas coisas estão atrasadas… Acho que a prioridade do Brasil é ganhar o Mundial. Não creio que seja organizar a Copa do Mundo", afirmou Valcke. "Não entendo por que as coisas não avançam. A construção dos estádios não está acontecendo dentro dos prazos. Por que será?", questionou o secretário. "Os organizadores precisam de um pontapé na bunda".

As palavras não foram bem recebidas pelo governo brasileiro, e o ministro do Esporte, Aldo Rebelo, afirmou no sábado (03) que não quer mais Jérôme Valcke como interlocutor da Fifa para os assuntos relacionados à Copa de 2014.

"As declarações são inaceitáveis, inadequadas para o governo brasileiro. As declarações contradizem completamente com o que o próprio secretário falou em sua visita no dia 17 de janeiro. As informações não são verdadeiras, porque os estádios estão inclusive adiantados ao cronograma inicial da Copa", disse Rebelo.

"Diante dessas declarações, que são palavras inadequadas e inaceitáveis para qualquer tipo de relacionamento, o governo brasileiro vai enviar uma carta ao Blatter informando que não aceita mais o secretário geral, Jérôme Valcke, como interlocutor. O governo brasileiro vai continuar trabalhando com a certeza de que o Mundial será um sucesso", completou o ministro. A reação do secretário da Fifa foi classificar a atitude do governo do Brasil de "infantil".

Não é de hoje que Valcke vive às turras com as autoridades brasileiras. Em um último comunicado publicado no site da Fifa, o secretário pediu rapidez com a aprovação da Lei Geral da Copa: "o texto deveria ter sido aprovado em 2007 e já estamos em 2012", declarou.

No meio do fogo cruzado, o presidente do Comitê Organizador Local (COL), Ricardo Teixeira, manteve discurso neutro e apenas ressaltou que tudo sairá como o planejado. "Algumas questões na organização da Copa do Mundo podem parecer que avançam lentamente. Mas em todo processo democrático as discussões devem ser amplas e sempre levar em conta os interesses do povo. O Brasil não tem um dono, é uma democracia sólida e reconhecida mundialmente. O país e seus três poderes devem ser respeitados sempre", disse Teixeira na nota.

"As preocupações da Fifa em relação aos preparativos de todas as Copas do Mundo são naturais e legítimas. Mas a entidade pode ficar tranquila porque o Brasil e seu povo têm competência e seriedade para organizar uma Copa do Mundo impecável, inesquecível", completou.

Repercussão

O presidente da Comissão Especial da Lei Geral da Copa da Câmara dos Deputados, Renan Filho (PMDB-AL), classificou nesta segunda-feira (5) de “insultuosas, descuidadas e inapropriadas” as declarações feitas pelo secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, sobre um possível atraso na organização da Copa no Brasil.

Em nota, Renan Filho argumentou que o governo e as instituições envolvidas na organização do Mundial não estão isentos de críticas, mas que as palavras “de linguajar chulo” de Valcke são “inadmissíveis”. “Enquanto interlocutor da Fifa com o governo brasileiro,  é inadmissível que o secretário-geral faça uso de expressões inconseqüentes, deselegantes e de linguajar chulo, sem considerar as responsabilidades que essa relação e esse cargo exigem”, disse o deputado.

De acordo com Renan Filho, a demora na votação da Lei Geral da Copa deve-se à realização de diversas audiências públicas para debater o projeto. O relator do texto está trabalhando para que a matéria seja votada novamente nessa terça (6) na Comissão Especial que analisa o assunto, acrescentou o deputado. O projeto chegou a ser aprovado pela comissão, mas, como a votação ocorreu simultaneamente à ordem do dia, o que é proibido pelo regimento da Casa, a proposta passará por nova votação.