Não tem que me contar/ seja o que for/ Galeria Raquel Arnaud, SP/ até 10/3

img1.jpg

chamada.jpg

img.jpg
INTRIGA
Autorretrato de Jorge Molder (no centro) está entre as fotografias apresentadas

Na semana em que Hollywood premia “O Artista” e o mundo reverencia o cinema mudo, uma exposição em São Paulo remonta às narrativas cinematográficas clássicas. Composta por 42 fotografias realizadas a partir de fotogramas de filmes, a exposição “Não Tem Que me Contar/ Seja o Que For” é, na realidade, um projeto de desmontagem cinematográfica, de autoria do fotógrafo português Jorge Molder. Como frames de um filme, as imagens se distribuem linearmente nas paredes do novo espaço da galeria Raquel Arnaud. Seu discurso, no entanto, é não linear e a narrativa se faz por saltos e associações subjetivas.

A série, realizada entre 2006 e 2007, foi apresentada anteriormente na Cinemateca Portuguesa em Lisboa, no Museu do Cinema de Madri e na sede da Fundação Calouste Gulbenkian em Lisboa, entre outros espaços na Europa. O grande mérito do trabalho não está em falar de cinema analógico em tempos de arte digital, nem em se apropriar de imagens prontas – o que dezenas, ou centenas, de artistas de todo o mundo fazem muito bem hoje. A habilidade de Molder está em extrair de outras cinematografias imagens tão particulares que poderiam ser suas. E, de fato, passam a ser, quando refotografadas e organizadas ao lado de suas escolhas. A imagens já estão tão “dominadas” que, quando Molder inclui na sequência um autorretrato, ele se comporta como um frame de filme.

img2.jpg
MISTÉRIO
Fotografia da série remete à ficção científica

Embora seja mais conhecido no meio da fotografia do que da arte contemporânea, aos 65 anos, Molder se destaca por um trabalho de construção de ficções fotográficas nas quais, não raro, atua como ator ou performer. Na imagem produzida para a série em exposição em São Paulo, ele se retrata em expressão intensa, digna de um filme noir.

Embora o título da mostra – enigmático – avise que “Não tem que me contar/ seja o que for”, muitas histórias são contadas nessa sala. Isso ocorre, em primeiro lugar, porque é o espectador quem dá a velocidade e faz a sequência de visualização do trabalho. E sua estrutura muda, portanto, de acordo com cada olhar.

Mas a história contada ganha múltiplas facetas, especialmente porque as imagens, além de se oferecem ao deleite da contemplação silenciosa, seduzem o espectador a procurar as relações ocultas – ou inexistentes? – entre as silhuetas de corpos, as faces que se escondem, as mãos em atitudes suspeitas ou os espelhos que se quebram. Ou mesmo a inventar essas relações, coroando esse discurso com um visualmente sonoro “The end”.