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Todos os dias, milhares de turistas visitam a Capela Sistina, no Vaticano, a mais famosa igreja católica do mundo. Independentemente do credo, saem maravilhados – e com uma ligeira dor no pescoço. Pintados pelo gênio da Renascença Michelangelo Buonarroti (1475-1564), seu teto e altar retratam pelo menos 300 figuras bíblicas. É tudo tão detalhista e tão magnificamente realizado que é preciso um bom guia para identificar os sete apóstolos e cada uma das nove passagens do Antigo Testamento ali representadas. No centro da composição está a criação do homem, com a marca registrada de todo o conjunto: o momento em que as pontas dos dedos de Deus e de Adão se tocam. Por mais de cinco séculos muitos passaram horas observando esse afresco. E viram mais do que cenas religiosas. Um médico americano, por exemplo, enxergou ai a forma de um cérebro. Agora, dois estudiosos sustentam que Michelangelo fez também insultos à Igreja de sua época por meio de sua obra mais conhecida e inscreveu em meio a essa majestosa glorificação do cristianismo ensinamentos divulgados pela cabala, que responde pela parte mística do judaísmo. São eles o rabino americano Benjamin Blech e o especialista em assuntos judaicos Roy Doliner. Suas revelações estão expostas em minúcias no livro "Os Segredos da Capela Sistina – As Mensagens Secretas de Michelangelo no Coração do Vaticano" (Objetiva), um livro que compete com qualquer obra do escritor americano Dan Brown, autor de "O Símbolo Perdido" e do popularíssimo "O Código Da Vinci".

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Muita gente, aliás, tem apelidado as especulações da dupla americana de "O Código Michelangelo", tamanha a lista de mensagens cifradas que eles acreditam ter descoberto no teto da capela. Logo na entrada estaria a primeira charada: o retrato do profeta Zacarias (que traz as feições do papa Júlio II, o contratador de Michelangelo) o mostra sendo "praguejado" pelas costas por dois anjos – a garantia disso é que um deles faz figa com a mão direita e esse gesto seria na época o equivalente ao nosso dedo médio em riste. A animosidade de Michelangelo em relação ao papa Júlio II não é inventada. Sua Santidade praticamente obrigou o artista a aceitar a encomenda de pintar os afrescos, arte que, segundo ele, que se considerava antes de tudo um escultor, não dominava. Imagine, então, se ele a "dominasse".

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As especulações mais arriscadas de Blech e Doliner, contudo, acontecem em relação às passagens bíblicas: elas fariam uma defesa veemente dos judeus, na época considerados cidadãos de segunda classe, especialmente por serem acusados pela morte de Jesus Cristo. Ao retratar a luta de Davi contra o gigante Golias, Michelangelo teria mostrado o combate dos guerreiros numa composição que reproduzia uma importante letra do alfabeto hebraico – o caractere conhecido como "guimel", que significa força. O mesmo acontece na cena em que a viúva Judite carrega a cabeça de Holofernes, chefe do Exército helênico, invasor da Palestina. Pode se identificar a forma do caractere "het", princípio feminino do cuidado e da proteção. Outra letra hebraica, "bet" (primeira letra do "Torá", os cinco livros sagrados de Moisés, cuja acepção mais importante é "casa de Deus"), aparece na posição das mãos do profeta Jonas. Segundo os estudiosos americanos, o conhecimento que Michelangelo tinha da cultura judaica viria do contato que ele teve com sábios como Marsilio Ficino e Pico della Mirandola, do círculo do mecenas Lorenzo de’ Médici, que recebera o artista aos 13 anos em seu palácio em Florença. Eles eram especialistas na cultura hebraica e teriam passado para o garoto os fundamentos do "Torá", da "Cabala", do "Talmude" e do "Midrash", as quatro formas de explicação dos textos bíblicos. A prova mais cabal da simpatia de Michelangelo por esse povo desgarrado seria a representação de Aminadab, homem de "devoção sincera", com um círculo amarelo na manga esquerda de sua túnica. Trata-se do distintivo de vergonha que os judeus eram obrigados a usar para serem distinguidos dos "bons cristãos" e que mais tarde foi adotado pelos nazistas sob a forma da estrela de Davi.

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