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Donas de enormes reservas de petróleo, a Nigéria e a Noruega integram o seleto grupo dos dez maiores países exportadores do produto no mundo. Ambas também têm a economia fortemente calcada no petróleo. As semelhanças, porém, terminam aí. Situada no Golfo da Guiné, na África Ocidental, a república da Nigéria começou a explorar suas jazidas em 1958 e desde então a vida de seus 148 milhões de habitantes não melhorou. Pelo contrário. Por mais de 50 anos, o petróleo vem servindo como combustível para a desigualdade social, a corrupção e a violência generalizadas.

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Apenas em 2007 o país fez sua primeira transição de governo democrática, mesmo assim após uma campanha conturbada, que registrou a morte de 50 pessoas. Apesar da riqueza que brota no solo e no fundo do mar nigeriano, o país ocupa um vergonhoso 154º lugar no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que combina três fatores: PIB per capita, taxa de analfabetismo e expectativa de vida.

Atrás apenas da Islândia no ranking do IDH, o reino da Noruega, na Península da Escandinávia, na Europa, virou sinônimo de experiência bem-sucedida de distribuição de riqueza a partir do petróleo. Desde 1971, quando os campos petrolíferos noruegueses começaram a ser explorados, a qualidade de vida da população não para de melhorar. "O Estado tem condições de proporcionar serviço de saúde pública, segurodesemprego, educação universal e outros benefícios para todos os segmentos da população", destaca Inge Nordang, ministro conselheiro da embaixada da Noruega no Brasil. "Tão extensa rede de bem-estar social não seria possível se não fosse a riqueza petrolífera do país."

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Um fator essencial para esse cenário foi a criação do Fundo de Petróleo, que praticamente isola parte dos lucros da commodity da economia. Aplicados no exterior, eles são posteriormente restituídos ao país. Embora tenha registrado prejuízos significativos na crise econômica mundial que eclodiu no ano passado, o fundo protege a Noruega do fenômeno conhecido como doença holandesa. Trata-se do fortalecimento excessivo da moeda local devido às exportações de petróleo, que provoca crises nos momentos de queda brusca da cotação do produto.

Nigéria e Noruega são os dois extremos de referências para o Brasil neste momento. Especialista em energia, David Zylbersztajn, ex-diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, lembra que o bom exemplo norueguês se reflete na importante textura industrial construída no país nas últimas décadas. Outro reflexo é a população, desenvolvida tanto econômica quanto culturalmente. "A Noruega é uma exceção, pois países onde a riqueza é o petróleo em geral não dão certo", diz Zylbersztajn.

"O país se acomoda, não se desenvolve e, em vez de avançar, pode regredir. É como viver de renda." A situação da Noruega é tão confortável que o reino criou há poucos anos o programa "Petróleo para o Desenvolvimento", para orientar outros países a explorar os recursos do petróleo de modo que os cidadãos também tirem proveito da riqueza natural. Um dos pioneiros do programa é o arquipélago de São Tomé e Príncipe, que fica no Golfo da Guiné, como a Nigéria.

Como facetas opostas à Noruega, no Oriente Médio há pelo menos outros três integrantes do grupo dos dez maiores exportadores: Arábia Saudita, Irã e Kuwait. Colocados em 55º, 84º e 29º lugares no ranking do IDH, esses países precisam importar praticamente todos os produtos usados no cotidiano e são governados por regimes fechados. Na mesma região, os Emirados Árabes, o quinto maior exportador mundial de petróleo, convivem com situação política similar. Só que nas duas últimas décadas começaram a romper com a barreira da dependência econômica, transformando-se em importante centro turístico e comercial. No ranking do IDH, os Emirados ocupam a 31ª posição.

Muito atrás dos Emirados Árabes, no 61º lugar da relação que mede a qualidade de vida em diferentes países, está a Venezuela, dona da sexta maior reserva de petróleo do mundo. Desde o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a economia venezuelana abandonou sua vocação agrícola para centrar-se quase com exclusividade na extração e exportação do petróleo. Norman Gall, diretor-executivo do Instituto Fernand Braudel de Economia Mundial, lembra que o fenômeno da doença holandesa vem ocorrendo no país desde a década de 1950. "Ao mesmo tempo que sustenta o país, o petróleo estragou a vida econômica da Venezuela", diz Gall. "Lá havia uma cafeicultura de alta qualidade que desapareceu por causa da taxa de câmbio e da bagunça institucional promovida por Chávez e pelos governos que o antecederam", completa, referindo-se ao presidente Hugo Chávez.

No poder desde 1999, Chávez lidera no continente um movimento boliviariano que aguçou os conflitos da região e a desigualdade social no país. "Acabo de voltar do Peru, que não tem petróleo e enfrenta problemas econômicos", conta Gall. "Mas os pobres do Peru estão vivendo muito melhor do que os da Venezuela." Um dos maiores importadores de petróleo da Venezuela, os Estados Unidos também têm grandes reservas e integram o rol dos dez maiores exportadores da commodity.

No solo americano nasceu e prosperou a moderna indústria petrolífera, mas o país também não é um exemplo a ser seguido, na opinião de Zylbersztajn. Para ele, a era do petróleo garantiu desenvolvimento, mas trouxe muito desperdício. Agora o mundo busca alternativas para o modelo americano, por causa de seus impactos ambientais. "Por maior que seja a reserva de um país, ele ficará numa situação complicada se houver um salto tecnológico e o petróleo se tornar obsoleto", diz Zylbersztajn. "A Idade da Pedra não acabou por falta de pedra."


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