Com as forças renovadas depois de ganhar em três dos quatro Estados com eleições primárias na semana passada, a senadora Hillary Clinton fez uma proposta ousada. Apesar de contabilizar menos delegados do que o senador Barack Obama, seu adversário na indicação para a candidatura presidencial do Partido Democrata, Hillary sugeriu a formação de uma chapa composta pelos dois. Quanto ao líder da chamada “chapa dos sonhos”, tinha a resposta na ponta da língua: “O povo de Ohio deixou bem claro que essa pessoa deveria ser eu.” Um dos três Estados que permitiram a ela interromper a seqüência de 11 vitórias consecutivas de Obama, Ohio é emblemático na campanha americana. Nas últimas quatro décadas, todos os presidentes eleitos haviam ganhado as convenções no Estado.

Obama desdenhou a proposta, mesmo com a derrota na última rodada de primárias. “É muito cedo para começarmos a falar de uma chapa conjunta”, disse, sorrindo. Pouco antes, sua equipe de campanha havia anunciado que adotaria uma postura mais agressiva. Na véspera das eleições em Ohio, a campanha de Hillary divulgou que as ressalvas públicas de Obama ao Nafta, o Tratado de Livre Comércio da América do Norte, não correspondiam às posições dele longe dos microfones e holofotes. O relato caiu como uma bomba no Estado, onde o alto índice de desemprego é visto como conseqüência direta do acordo comercial entre EUA, Canadá e México. O próprio Obama reclamou que Hillary havia sido muito “negativa” em relação a ele, mas reconheceu que a atitude impulsionara a campanha da senadora.

Invertendo os papéis depois da revigorada de Hillary, o senador questionou o fato de ela não ter divulgado até hoje sua declaração de rendimentos relativa a 2006. Na seqüência, tentou minar a autoproclamada maior experiência da senadora em política externa. “Qual é exatamente a experiência internacional que ela está reivindicando?”, ironizou Obama. “Ela estava negociando acordos ou administrando crises durante esse tempo?”, completou, referindo-se às visitas feitas por Hillary a cerca de 80 países.

As mais recentes farpas trocadas entre os dois são apenas uma amostra do que deve acontecer na campanha até o dia 22 de abril, quando ocorrem na Pensilvânia as próximas primárias relevantes. Lá, está prevista a escolha de 188 delegados. Por enquanto, Obama conta com 1.299 e Hillary com 1.180. Dificilmente um deles atingirá no total das primárias a maioria de 2.045 delegados necessários para conquistar a indicação democrata para a corrida à Casa Branca. Para isso, vão depender dos superdelegados, como são conhecidos os 796 integrantes do partido que votam na convenção nacional sem precisar levar em conta o resultado das primárias. É justamente com eles que Hillary está contando. Junto com o marido, Bill Clinton, ela tem grande influência na máquina partidária democrata, mas Obama está tentando neutralizar esse fator. Nos últimos dias, passou a defender que os superdelegados deveriam acompanhar a vontade popular.

Ao contrário dos republicanos, que terminaram a semana com seu candidato presidencial indicado (leia quadro ao lado), os democratas parecem dispostos a continuar com a disputa interna até o começo de junho, quando acontece a última primária, em Porto Rico. Antes da surpreendente volta por cima de Hillary, estrategistas do partido tentavam convencê-la a renunciar depois das primárias de Ohio, para evitar que o acirramento da disputa acabasse cindindo o próprio partido. Ela jamais foi receptiva à idéia. Da mesma forma, Obama não demonstra nenhuma disposição em participar de uma chapa encabeçada por Hillary, até porque pesquisas como uma recém-realizada pelo Washington Post/ABC News mostram que ele tem mais chances de vencer o republicano John McCain do que a ex-primeira-dama. De qualquer forma, uma composição entre os dois pré-candidatos é o sonho dos estrategistas democratas, seja quem for o cabeça da chapa. O problema é que nenhum deles quer ser vice do outro.