i75744.jpgO que importa é a beleza interior." "Quem ama o feio, bonito lhe parece." "A beleza está nos olhos de quem vê." Bordões como esses tratam a aparência física como algo pessoal, subjetivo e até desnecessário. Mesmo com a intenção de relativizar a importância do belo, o feio é um tabu, até quando se fala da feiúra. É como se a palavra não existisse. No cinema e na tevê, os heróis e mocinhos são atraentes. Nos anúncios, a beleza é fundamental – o feio não vende. Mas se o belo soa como algo abstrato, a feiúra tem contornos muito concretos.

Uma pesquisa divulgada pela publicação American Economic Review intitulada Beauty and the Labour Market (Beleza e Mercado de Trabalho) estima que as pessoas pouco atraentes têm salário de 5% a 10% menor e se casam com quem tem menos dinheiro do que elas. Segundo o estudo, Why Beauty Matters? (Por que a beleza importa?), que analisa o impacto da feiúra na vida das pessoas, os belos têm mais chances de desenvolver habilidades de comunicação e autoestima porque recebem mais atenção desde a infância.

Se antigamente os feios só poderiam lamentar a falta de sorte, hoje, eles têm a lei ao seu lado se forem discriminados. Apesar de não haver uma menção clara na legislação brasileira – apenas em relação à cor, condição social, sexo ou religião -, a Justiça entende que punir uma pessoa pela feiúra pode gerar constrangimento e humilhação. Dois meses atrás, uma loja da C&A em Curitiba (PR) foi condenada a pagar R$ 30 mil de indenização por danos morais a uma funcionária demitida com a justificativa de que "era bonita do pescoço para cima e feia do pescoço para baixo". Também, aos 38 anos, estaria velha para o cargo. O chefe ainda dizia que a atendente deveria se espelhar na outra funcionária, uma "menina novinha e bela".

Afinal, o que é a feiúra? Para a psicóloga Joana de Vilhena Novaes, autora do livro O intolerável peso da feiúra sobre as mulheres e seus corpos (Editora PUC Rio), no Brasil, a ausência de beleza está relacionada ao excesso de peso, principalmente no grupo feminino. "O gordo sempre tem de compensar sendo engraçado, amigo, estudioso e é associado à falta de agilidade e competência", afirma. Outra razão da intolerância à feiúra é a ampla oferta de tratamentos estéticos e cirurgias plásticas para corrigir imperfeições. "É como se as pessoas fossem feias por opção. Seriam desleixadas, indisciplinadas e incapazes de fazer sacrifícios para se tornarem belas", avalia a psicóloga.

i75746.jpgEm 2006, estreou nos EUA a série de tevê Ugly Betty (Betty, a Feia), adaptada de um programa homônimo na Colômbia. A série, que aborda o tema da feiúra, suscitou no mesmo ano a campanha Be Ugly (Seja Feio), promovida pela rede de tevê ABC, que estimulava as pessoas a não se preocuparem com a beleza. Não adiantou. "O seriado não mudou a rejeição contra a feiúra porque o tema é retratado como um reforço ao conceito do belo.

A atriz que interpreta a personagem é bonita. A feiúra é apenas na ficção, não na realidade", disse à ISTOÉ o sociólogo canadense Anthony Synnott, autor da pesquisa Ugliness – Visibility and The Invisible Prejudice"(Feiúra – Visibilidade e o Preconceito Invisível), publicada neste mês no Glimpse Journal. Segundo Synnott, os feios estão à margem porque não estão inseridos num grupo, ao contrário dos belos, que se unem numa casta. O curioso é que, historicamente, o feio é o comum e o belo, a raridade. A situação se inverteu. Hoje, a beleza é mais do que um bom dote. É uma exigência, um objetivo a ser conquistado por todos.