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Foi-se o tempo em que arte digital era novidade no Brasil. Hoje esse circuito está tão estabelecido que dois festivais acontecem simultaneamente em duas capitais brasileiras. O FAD – Festival de Arte Digital está em sua quinta edição e tem sempre como sede a cidade de Belo Horizonte. “Hoje possuímos um edital público do qual temos cerca de 60% de participação de brasileiros contra 40% em 2008”, comenta Tadeus Tee, diretor do festival. Com o tema centrado na cinética, o evento alavanca novos nomes da arte digital brasileira, como o artista e publicitário carioca Cadu Lacerda, que participa com a obra “Parassimétrica”, um código computacional que transforma a digitação das letras e números em cortes de uma escala cromática.

“Se você olhar a produção nacional em relação ao volume de obras internacionais, nós teremos menor quantidade. Mas, em qualidade e técnica, estamos cada vez mais próximos dos estrangeiros”, comenta Julius Wiedmann, editor da Taschen e curador da segunda edição da Mostra 3M de Arte Digital, que acontece em São Paulo. Com o boom de exposições e festivais dedicados à arte digital, Wiedmann aponta que é cada vez mais necessário buscar um diferencial curatorial. Assim, nem tudo o que ele expõe pertence ao universo digital. “Na mostra, há obras feitas com tecnologia analógica, mas que questionam a influência do digital no mundo em que vivemos”, afirma. Outra intenção da Mostra 3M é a de apontar o perfil dos artistas que trabalham com arte digital. “No Brasil, eles geralmente tinham formação em artes, mas isso está começando a mudar agora”, comenta Wiedmann. Exemplo é o designer brasileiro Paulo Barcellos, que realiza uma série de trabalhos focados na criação de interfaces entre humanos e computadores. Seu “Colors of Movement” é uma experiência interativa que revela através das cores o espectro total dos movimentos de quem se posiciona em frente à obra. “O importante na arte digital é a sua interdisciplinaridade e acho que isso é que deve ser mostrado. Não basta a tecnologia pela tecnologia”, enfatiza o curador. 

 

Entrevista Julius Wiedmann-curador da 2º Mostra de Arte Digital 3m

Você pode apontar quais foram são as diferenças entre a primeira e a segunda edição do Festival 3M?
As diferenças são grandes. Nesta segunda edição nos voltamos para uma curadoria de arte contemporânea feita a partir de plataformas digitais. Na primeira edição foi voltada para outro tipo de produção, como propagandas e animações feitas em plataforma digitais. Agora, quisemos olhar para os artistas contemporâneos cuja produção foi feita a partir de plataformas digitais. Inclusive, na mostra, existem algumas obras que executadas com tecnologia analógica, mas de alguma maneira, dialogam com a lógica contemporânea do mundo digital em que vivemos.

A produção brasileira vem se equiparando em relação a produção internacional, tanto em quantidade quanto em qualidade. Existe algum diferencial entre a produção brasileira e a produção internacional?
Se você for olhar a produção nacional em relação ao volume de obras produzidas no campo digital em relação ao internacional, nós teremos menos quantidade. Temos artistas incríveis e de grande qualidade, como por exemplo, o Márcio Ambrósio que está participando de uma residência na Bélgica, ou até mesmo o Paulo Barcelos, que está na Mostra 3M. Acho que estamos chegando junto dos estrangeiros. A diferença é a tradição internacional dos grandes centros de produção como os Medialabs da Europa e EUA. Lá como a disponibilidade de recursos para esse tipo de produção é maior, obviamente, é lá também que estão os grandes expoentes. Tradicionalmente, no Brasil, os artistas vêm das escolas de arte. Lá fora, isso necessariamente não acontece. O Jonathan Harris, por exemplo, não estudou em uma escola de artes_ ele é formado em computação. Na exposição temos artistas formados em Ciências da Informação, Engenharia e outros artistas que não possuem artes na formação, mas que por estarem em um campo ligado ao digital, acabam se voltando para as artes. Aqui isso está começando agora. São poucos os artistas brasileiros que não possuem a formação em artes, mas que trabalham com ela. Na mostra 3M também temos artistas cuja formação é em design. Os artistas mais novos é que estão começando a participar dessa tendência. Eu acho que um artista é um artista independente de sua formação. A diferença é que lá fora, ainda, você tem possibilidades de execuções mais grandiosas. Mas em termos de criatividade e técnica acho que estamos chegando junto da produção estrangeira.

Entrevista com Tadeus Tee – Diretor do 5º Festival de Arte Digial-Belo

Atualmente estamos vivendo um boom de festivais dedicados a arte digital no país. Como você avalia isso? Qual é o diferencial do FAD em relação a outros festivais do gênero?
Eu sempre digo às pessoas que no caso de Belo Horizonte, neste fenômeno que é global, a cidade tem mostrado certa vocação para arte através das mídias. Hoje abrigamos cerca de 10 ou 12 ações distribuídas ao longo do ano. Entre projetos de residência artística aos festivais de pequeno e médio porte como é o caso do FAD. Claro que temos uma centralização de ações em São Paulo e Rio de Janeiro, mas não vejo de forma isolada, cidades como Belém, Porto Alegre, Salvador entre outras. No FAD 2010, por exemplo, tivemos a presença de três artistas do norte e nordeste do País. A Arte é também o reflexo de uma sociedade no seu mais amplo campo de atuação e representação. O número crescente de fóruns, simpósios, festivais, feiras e eventos midiáticos e artísticos é o espelho do que vivemos diariamente, do que está inserido incondicionalmente, muitas vezes, na vida das pessoas. Apesar de falarmos de arte digital e parecer que tratamos do futuro, em sua maior parte estamos retratando mesmo é o presente. O FAD em Minas Gerais se diferencia por dois pontos; A valorização artística vem antes da valorização tecnológica; O FAD fomenta a produção e possui grande preocupação na formação de novos artistas e pensadores ou técnicos digitais através das ações do educativo e disponibilidade para novos nomes nas atividades do festival.

 

Por se tratar de um festival internacional de arte digital, muitos artistas estrangeiros participaram dessa edição e de outras anteriores. Você acha que existe alguma diferença entre a produção brasileira na área e a de outros países?
Existe. As principais diferenças partem do domínio sobre as ferramentas. Não é geral, mas na maioria das circunstâncias quando se obtêm o domínio técnico, o resultado final é diferenciado. Neste ponto os estrangeiros são estudiosos. O Brasileiro é mais prático. Da tentativa e erro, mais do que do estudo. Não falo de estética, pois o Brasil tem suas peculiaridades que por sua vez vem de influências da própria cultura que estamos inseridos. No âmbito dos conceitos, teorias e ensaios, os Brasileiros tendem a dominar melhor a linguagem teórica para seus trabalhos e ações, conseguindo uma equivalência, comparativamente, na proposição dos seus trabalhos. Isso mesmo que a distância, por exemplo, entre a baixa e a alta tecnologia se explique ainda por fatores econômicos, mas que nem sempre podem ser usados como justificativas. O acesso é em dúvida uma barreira, mesmo em tempos de Google e outras facilidades. A forma como a arte digital no Brasil se iniciou, vinda em sua maioria da influência dos grandes nomes da video-arte, também influencia na técnica a na estética.