12/08/2009 - 10:00
"Estou dividido", disse Estevam Hernandes, um dos fundadores da Igreja Renascer em Cristo, logo que subiu ao palco da sede internacional do grupo religioso, durante culto na noite da quarta-feira 5. As 2,5 mil pessoas que lotavam o galpão da sede, na zona leste de São Paulo, e gritavam em uníssono "ôôô, o paizão voltou" silenciaram. "Estou feliz por estar de volta ao Brasil, mas triste pelo meu "E filho, o Bispo Tid", completou. Estevam e sua mulher, Sônia – conhecidos como "apóstolo" e "bispa" e líderes de uma das mais poderosas denominações neopentecostais brasileiras – passaram os últimos 32 meses em Miami, nos Estados Unidos, cumprindo pena por tentar entrar no país com US$ 56,5 mil em dinheiro, tendo declarado apenas US$ 10 mil. E voltaram às pressas ao País por causa de um drama familiar.
A 15 dias do fim da sentença, o casal – que cumpriu cinco meses da pena em regime fechado e de maneira alternada, outros cinco em prisão domiciliar e mais um período em liberdade controlada por pulseiras GPS – recebeu a notícia de que o mais velho dos três filhos, Felippe Daniel Hernandes, de 30 anos, sofrera graves complicações durante uma cirurgia complementar ao processo de redução de estômago. Com a saúde frágil desde a infância – ele fez um transplante de rim, doado pelo pai, aos 14 anos -, o bispo Tid, como é conhecido na igreja, estava internado na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo, em estado gravíssimo e com possível comprometimento neurológico. Em função das circunstâncias, o juiz americano reduziu a pena em duas semanas para que o casal pudesse acompanhar o filho doente.
Desde então, Estevam e Sônia quase não saem do lado do filho, embora tenham comparecido em culto horas após desembarcarem e na quarta-feira 5. O casal tem tido o apoio da pastora Caroline Celico, a senhora Kaká, presente no palco da sede internacional na semana passada. "Eles se mudaram para o hospital", diz uma amiga da família. Lá, dois representantes da igreja se alternam para manter uma corrente de oração e canto 24 horas por dia na antessala da UTI, onde estão parentes de outros 33 pacientes.
Nos jardins e no entorno do hospital, fiéis com crachá e colete da Renascer montam uma espécie de guarda espiritual para o herdeiro de seus líderes. Em todas as cerimônias dos 800 templos da Renascer, o estado de saúde do bispo Tid é lembrado. No culto do sábado 1º, por exemplo, os 30 mil fiéis que compareceram à Ceia de Oficiais no Ginásio do Ibirapuera, em São Paulo, se viraram em direção ao Hospital Oswaldo Cruz para orar por ele.
A preocupação se justifica. Para muitos, o bispo Tid – que tem uma irmã, Fernanda, 26 anos, e um irmão adotivo, Gabriel, 14 anos – é o sucessor natural de Estevam no comando da Renascer. Como bispo, ele está a um passo de se tornar apóstolo dentro da hierarquia da igreja, que começa nos aspirantes, passa pelos diáconos, presbíteros – como Kaká-, pastor, bispo e apóstolo. Mas a sucessão não estava na iminência de acontecer.
E o casal Hernandes deixou isso claro ainda na Flórida, quando comandava cultos por videoconferência com frequência semanal. "Eles voltam para assumir uma igreja forte", argumenta um ex-bispo do grupo religioso. "A igreja continuou com um corpo razoável de fiéis, mesmo depois dos escândalos no Brasil e nos Estados Unidos e agora o rebanho deve crescer ainda mais", explica.
Quando fala de escândalos no Brasil, o dissidente se refere às denúncias do Ministério Público de São Paulo feitas em 2006 contra o casal pelo suposto crime de lavagem de dinheiro, evasão de divisas e estelionato. Segundo o promotor Arthur Lemos Jr., ainda corre pelo menos um processo por lavagem de dinheiro contra eles. "Vamos notificar a Justiça do retorno dos dois e retomar as audiências", diz Lemos. Até lá, ainda serão muitos os cultos animados. Com a volta do "paizão" e da "mamãe", como Estevam e Sônia são chamados pelos fiéis, é tempo de festa na Renascer. E, para esse rebanho, é só isso que parece importar.
FOTOS: JULIA MORAES/AG. ISTOÉ