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OMISSÃO
Passos liberou recursos para três obras sabendo
que elas estavam paralisadas pelo TCU

Sua escolha foi uma cartada da presidente Dilma Rousseff para moralizar o setor de Transportes, alvo de uma enxurrada de denúncias nas últimas semanas. Mas, ao contrário do que se esperava no Palácio do Planalto, o novo ministro Paulo Sérgio Passos assume o órgão já rodeado de questões polêmicas. Quando exerceu o cargo interinamente no ano passado, para que Alfredo Nascimento fizesse campanha ao governo do Amazonas, Passos liberou um total de R$ 78 milhões em créditos suplementares para três grandes obras. Os empreendimentos constavam da lista de irregularidades graves do Tribunal de Contas da União, que identificou pagamentos antecipados, ausência de projeto executivo, fiscalização omissa e, é claro, superfaturamento. Em vez de optar pela prudência, o ministro interino assumiu o risco de autorizar os repasses contra todas as determinações do órgão de controle. O caso poderia se resumir a um mero problema de gestão, mas, conforme apurou ISTOÉ, várias das empreiteiras beneficiadas pelos aportes extraordinários doaram milhões a candidatos do próprio PR durante a campanha eleitoral.

A campeã em doações foi a construtora Sanches Tripoloni, que repassou nada menos que R$ 2,5 milhões para o partido que controla os Transportes. Desse total, R$ 500 mil caíram diretamente na conta do comitê de Blairo Maggi, eleito senador por Mato Grosso e cotado para a pasta. Maggi foi beneficiado duplamente, pois Sinval Barbosa (PMDB), seu candidato ao governo de Mato Grosso, recebeu da mesma empreiteira mais R$ 1,2 milhão. As novas suspeitas de uso da máquina pública em benefício do Partido da República podem complicar a vida do recém-nomeado ministro. Para o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP), os fartos indícios de corrupção e uso da máquina reforçam a necessidade de uma Comissão Parlamentar de Inquérito. “Essa conduta do Sérgio Passos é temerária, caracteriza o uso político-partidário dos Transportes. ”, afirma Rodrigues.

O PR também foi agraciado com a generosidade das construtoras Egesa e CMT Engenharia, parceiras da Tripoloni no consórcio responsável pela implantação e pavimentação da BR-265, em um trecho entre as divisas de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Nessa obra o TCU identificou sobrepreço, problemas fundiários e de segurança. Mesmo com recomendação de paralisação, Passos liberou R$ 40 milhões, a maior parte do crédito extraordinário. Meses depois, a Egesa Engenharia S/A, sozinha, doou R$ 850 mil para oito candidatos do partido. O deputado federal Aracely de Paula (MG) recebeu R$ 200 mil, Sandro Mabel (GO) levou R$ 100 mil, assim como José Henrique de Oliveira (AM) e Aelton José de Freitas (MG). O ex-líder do PR, Luciano Castro (RR), outro nome que chegou a ser cotado para substituir Alfredo Nascimento, recebeu R$ 50 mil da Egesa e mais R$ 200 mil da CMT Engenharia.

Já o consórcio das empreiteiras Carioca Engenharia, Serveng e SA Paulista, que recebeu R$ 20 milhões em créditos extras para a ampliação e reforma da BR-101 em um trecho na região metropolitana do Rio, repassou oficialmente para as contas do PR outros R$ 800 mil. Desse valor, R$ 400 mil saíram da Serveng diretamente para a campanha de reeleição do senador Magno Malta (ES), que tem o irmão Maurício Pereira Malta acomodado no quarto andar do Dnit na assessoria parlamentar. A construtora SA Paulista injetou mais R$ 100 mil no comitê eleitoral de Malta. O deputado federal Edson Giroto, outro nome cotado para os Transportes, também recebeu R$ 100 mil da Serveng.

Não bastassem as irregularidades já apontadas, a empreiteira Carioca Engenharia conseguiu, no apagar das luzes da gestão interina de Passos, um aditivo contratual de R$ 1,1 milhão ao contrato da BR-101, que originalmente era de R$ 66,4 milhões e chegou a R$ 81,7 milhões. A situação geral dessa obra, aos olhos do TCU, é o maior exemplo do “descontrole” a que se referiu a presidente Dilma Rousseff na fatídica reunião com a cúpula do PR. Os valores descritos acima se referem ao que os auditores passaram a chamar de “fase 2” do contrato TT-227. Um eufemismo para explicar que o consórcio não conseguiu cumprir o primeiro contrato, batizado de “fase 1”. “Em face da extrapolação dos limites legais impostos e tendo em vista a impossibilidade de se concluir a obra com o contrato TT-227/2006-00, foi lançado novo edital, do qual resultou o contrato TT-267/09-00, cujo objetivo contempla serviços remanescentes daquele contrato inicial”, afirma relatório do TCU. Como se não bastasse o fato de não ter sido cumprido, o contrato inicial teve o valor inflado de R$ 142,9 milhões para R$ 178,6 milhões.

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O senador Randolfe Rodrigues afirma que já tem 23 assinaturas para a abertura da CPI no Senado, e só precisa de mais quatro para viabilizá-la. “A CPI não deve se limitar à questão do ex-ministro. Temos que investigar o funcionamento, toda a engrenagem dessa caixa-preta em que se transformou o Ministério dos Transportes”, disse à ISTOÉ. Ao que parece o “modus operandi” para encher os cofres do PR com dinheiro público, adotado pelo ex-ministro Alfredo Nascimento sob a coordenação do deputado Valdemar Costa Neto, foi mantido.
Se a escolha de Passos objetivava estancar a sangria de denúncias e moralizar a pasta, com um perfil mais técnico, certamente não surtiu o efeito desejado. Os sinais, aliás, foram dados já na posse do novo ministro. Sérgio Passos rendeu elogios ao diretor afastado do Departamento Nacional de Infraestrutura dos Transportes, Luiz Antônio Pagot, que depôs no Senado sobre as denúncias de que o Dnit seria usado para abastecer o caixa 2 do PR. Pagot, por sua vez, também elogiou Passos e disse que todas as decisões sobre repactuação de valores de obras e aditivos foram tomadas de forma colegiada. O que dá a entender que Passos, enquanto secretário-executivo dos Transportes, tinha conhecimento do que acontecia no órgão.

Isso explica o desprendimento de Passos em contrariar a ordem da presidente Dilma, que pediu a suspensão por 30 dias de licitações, projetos e obras, para que se fizesse um pente-fino nos gastos da pasta. Em audiência na quarta-feira 13, Passos disse aos deputados da subcomissão de fiscalização das obras do PAC que é contra a medida da presidente. De outro lado, as lideranças do PR viveram uma semana de incertezas e divisões internas. Talvez por prenunciarem o que já estava por vir. A bancada na Câmara ficou magoada por não ter sido ouvida pelo Palácio do Planalto na escolha do novo ministro. Eles tinham nomes para indicar, incluindo alguns integrantes da bancada. “Foi criado um desconforto não pelo Paulo Sérgio, mas pelo modo de fazer as coisas. O próprio Paulo Sérgio estava na nossa lista”, resumiu Luciano Castro (RR). Os deputados chegaram a analisar a possibilidade de boicotar o jantar com a presidente Dilma Rousseff no Palácio da Alvorada, na quarta-feira. Mas logo desistiram. Fazer oposição não é exatamente o sonho de um partido construído a partir da ocupação de cargos públicos e da liberação de verbas federais.

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A força de Pagot

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SILÊNCIO
Pagot ameaçou, mas não disse nada nas sabatinas da Câmara e do Senado

O diretor afastado do Dnit, Luiz Antônio Pagot, passou dias ameaçando revelar o que sabe sobre o esquema de corrupção no Ministério dos Transportes. Chegou a citar nominalmente o nome do atual ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, mas, quando foi sabatinado no Congresso, nada disse. Seu comportamento animou o PR e líderes da base aliada a cogitar a possibilidade de sua anunciada demissão ser revista pelo Planalto. A presidente Dilma Rousseff, no entanto, na quarta-feira 13, deixou claro a diversos interlocutores que o afastamento de Pagot é irreversível. Apesar do recado, na quinta-feira 14, o senador Blairo Maggi (PR-MT), padrinho político de Pagot, voltou a pressionar o governo em nome do afilhado. Mas a presidente está convencida de que a manutenção do diretor à frente do Dnit contribuirá para manter o órgão na mira da oposição. O deputado Fernando Francischini (PSDB-PR), que também é delegado, pretende investigar como um burocrata pode ter acumulado um patrimônio com mais de duas mil cabeças de gado, além de fazendas em Mato Grosso e no Amazonas.


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