Arte
Rodrigo Matheus (Casa Triângulo, São Paulo) – A luz fria dos escritórios dá o tom da exposição do artista paulistano, cujo trabalho investiga o circuito paranóico embutido em mobiliários de repartições e em equipamentos de segurança. Sob um emaranhado de luzes fluorescentes aparece um aquário feito de vidro fosco, sugerindo que os peixes tropicais – vivos – se encontram dentro de um bloco de gelo. Na parede, um armário espreita com seu cinza-chumbo – o que, no contexto de uma galeria, chega a ser assustador. A mesma operação de ressignificar objetos cotidianos aparece na tevê de tela branca do mezanino, lançando seus raios catódicos para diplomas também em branco, à frente. Para quebrar o clima gélido, o humor irrompe na caixa de vidro com uma paisagem nevada, feita de isopor. Enquanto o ventilador lança as bolinhas brancas para os lados, o visitante sente um inesperado aroma floral. Não perca. (Ivan Claudio)

DVD
Força do mal (Classicline) – Judeu e comunista, o cineasta americano Abraham Polonsky (1910-1999) teve sua carreira enterrada pelo macartismo, vindo a realizar apenas cinco títulos, entre eles Willie Boy (1969), com Robert Redford. Força do mal (1947) foi a sua estréia atrás das câmeras, um amargo filme noir passado na Nova York mafiosa do pós-guerra, naquele mesmo hábitat corrompido dos filmes de Martin Scorsese, grande cultor desta obra-prima pouco conhecida. John Garfield, outro incluído na lista negra, encarna um advogado a serviço da loteria ilegal, que monta um golpe para acabar com todos os pequenos gangsters da jogatina em favor do seu chefão. Acontece que entre as vítimas está o seu irmão mais velho. Reencenação do mito de Caim e Abel, o filme tem personagens comoventes e diálogos do nível dos grandes trágicos. Assista até o fim. (Ivan Claudio)

Livros
Cinzas do norte (Companhia das Letras, 311 págs., R$ 39) – O escritor amazonense Milton Hatoum bem poderia ser mais um autor regional, dedicado ao aspecto mais exótico da vida levada na canícula nortista. Mas ele sempre se cobrou mais – e o resultado se traduz em uma obra rica e coerente, sempre matizada pela atmosfera amazônica, mas absolutamente universal no trato das paixões e emoções. Em Cinzas do norte, ele demonstra mais uma vez que maneja a natureza humana com a precisão de poucos. Não é à toa que homenageia, na abertura, o grande Guimarães Rosa, ao citar-lhe a frase “Eu sou de onde eu nasci. Sou de outros lugares.” Hatoum pertence ao mundo todo e invoca o que em todo o mundo se acha ao narrar a história de dois homens que têm suas vidas entrelaçadas – uma difícil, espartana, a outra angustiada e cheia de revolta. A felicidade, na obra, permeia raros momentos de simples viver, mas os valoriza. O resultado é um raro elogio à amizade humana. Leia sem parar. (Luiza Pastor)


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