O ministro dos Transportes enfrenta agora uma nova polêmica. Exonerado na quarta-feira 11, o ex-diretor financeiro do Departamento de Infra-Estrutura de Transportes (DNIT) Sérgio Pimentel, indicado pelo PTB paulista, caiu atirando. Disse que o ministro Anderson Adauto favoreceu a empreiteira Queiroz Galvão na cronologia de pagamentos de dívidas de 2002 do governo com as empresas. O ministro acusa Pimentel de ter sido afastado por cobrar propinas na liberação de verbas para os credores do governo.

O chumbo trocado começou no dia 26 de maio. Pimentel conta que reuniu no seu gabinete dois mandachuvas da Associação Nacional das Empresas de Obras Rodoviárias (Aneor), o diretor Valdir Reis e o vice-presidente, Tito Valadares. Ficou combinado que o DNIT parcelaria em três vezes o valor da dívida com as empreiteiras, que é de R$ 670 milhões. A primeira parcela, de R$ 124 milhões, e outras duas em 30 e 60 dias. “Os empreiteiros concordaram na hora”, assegura Pimentel.

No dia seguinte, Adauto convocou Pimentel para outra reunião sobre o mesmo assunto. Estavam na sala, além dos dois, o presidente da Aneor, José Alberto Ribeiro, o diretor-geral do DNIT, José Antônio Coutinho, e um único diretor de empreiteira, o da Construtora Queiroz Galvão, a maior credora do governo. Na reunião, conta Pimentel, o ministro determinou que deveriam ser acrescentados R$ 30 milhões à primeira parcela de R$ 124 milhões. Em vez dos R$ 8 milhões iniciais, o Ministério dos Transportes entraria no bolo com R$ 38 milhões. Os outros R$ 116 são recursos liberados pelo Ministério do Planejamento. Segundo Pimentel, “se fosse mantido o primeiro critério, a Queiroz Galvão iria receber perto de R$ 600 mil, e não R$ 8,7 milhões”. Além de ser a maior beneficiária da elasticidade ordenada pelo ministro, a mesma empreiteira recebeu outros R$ 14,8 milhões por obras no Estado de Pernambuco. “Eu recebi ordem expressa do ministro para pagar Pernambuco. Só depois soube que era obra da Queiroz Galvão”, revela Pimentel.

Adauto argumenta que, quanto à obra de Pernambuco, o pagamento foi feito a pedido do ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu: “Havia um compromisso com o governador Jarbas Vasconcelos”, afirmou. No mais, cumpriu apenas o acordo feito com as 111 empreiteiras da Aneor. “Eu propus pagar metade da dívida que cada uma tinha direito. Mas a própria Aneor pediu para respeitar o princípio cronológico, de quem estava na fila havia mais tempo.” Procurado por ISTOÉ, José Dirceu, através de sua assessoria, afirmou: “O DNIT informou ter obedecido rigorosamente a cronologia de pagamento.”

Entre 28 de maio e 2 de junho saíram os pagamentos. Mas é no processo de liberação que surge o nó. Pimentel autorizou as ordens bancárias e, como de praxe, as encaminhou ao outro responsável pela liberação do dinheiro, o diretor-geral do DNIT, José Antônio Coutinho. Quando a papelada voltou à sua mesa, Pimentel viu que a assinatura final era de Lauro Guimarães Corrêa, gerente de Orçamento e Finanças e seu subordinado. O ministro exibe uma portaria de 13 de junho – 11 dias após o pagamento às empreiteiras – que autoriza um simples gerente a assinar no lugar do diretor-geral do DNIT. Antes da portaria, só havia uma autorização verbal. “Houve um erro formal”, admitiu o consultor jurídico do ministério, Julio Pereira, na assinatura do gerente no lugar do diretor do órgão para a liberação final.

Lauro Corrêa, que exerce um cargo de segundo escalão, tem trânsito livre com o ministro. Foi candidato a vice-prefeito na chapa de Adauto na candidatura derrotada à Prefeitura de Uberaba em 2000. Pimentel disparou dois ofícios para os órgãos de controle interno denunciando a derrapagem oficial. No mesmo dia, 11 de junho, foi convocado para uma reunião com Adauto, que pediu sua demissão: “Estou sabendo que o senhor está abordando empreiteiras para obter vantagens financeiras. Quero que o senhor peça demissão.” Pimentel retrucou: “Nunca abordei ninguém. Se eu me demitir, estarei assumindo a culpa de atos que não pratiquei.” O ministro, que confirmou o diálogo, encerrou a conversa dizendo que pediria outro nome ao PTB para o cargo.

Adauto afirma que começou a suspeitar do DNIT devido à presença de Cláudio Dreer na equipe de Pimentel. Dreer foi o primeiro indicado pelo PTB para o cargo, mas não pôde ocupar o posto por ser dono de uma empresa que trabalhava para o próprio DNIT. O governo não teve a mesma cautela ao nomear Pimentel. Até maio de 2001, ele foi sócio da Depvia Engenharia e Consultoria e teve contratos em 2000 com o ministério no projeto da Hidrovia do Tocantins. Nessa época, ele já era servidor dos Transportes.

Contra – ataque ministerial

ISTOÉ – Como o ex-diretor Sérgio Pimentel chegou ao cargo?
Adauto
– Foi indicado pelo PTB. Ele tinha vivência na área, aprovamos o currículo e fizemos a indicação.

ISTOÉ – O sr. aprovou o currículo?
Adauto
– Os currículos passam por processo prévio de avaliação. Quando alguém é sócio de alguma empresa, isso aparece.

ISTOÉ – O sr. sabia da sociedade de Pimentel com a empresa Depvia?
Adauto
– Não tive conhecimento. Quem faz serviço de checagem é a Casa Civil da Presidência, não somos nós que fazemos.

ISTOÉ – A falha foi da Casa Civil?
Adauto
– Foi. Esse trabalho de análise dos currículos é da Casa Civil.

ISTOÉ – O sr. demitiu Pimentel sob acusação de extorsão?
Adauto
– As informações que eu tinha eram de que a diretoria financeira estava abordando empresários para receber vantagens financeiras. Pimentel negou. Mas eu tenho os elementos para demiti-lo.

ISTOÉ – Ele acusa o sr. de favorecer a empreiteira Queiroz Galvão também no pagamento de Pernambuco.
Adauto
– Foi um compromisso da Casa Civil com os governadores de Pernambuco e do Amapá para pagamento imediato. O José Dirceu me disse: “Olha isso aqui, os governadores estão precisando receber e gostaríamos que você fizesse a priorização possível desses dois Estados.” Eu tentei explicar ao Zé Dirceu sobre a liberação em ordem cronológica. “Bom, mas nós temos que pagar, nós fizemos o compromisso”, insistiu o ministro da Casa Civil.

ISTOÉ – Por que o gerente financeiro assinou ordens bancárias no lugar do diretor-geral? (O ministro passa a palavra ao procurador-geral do DNIT, Júlio Cesar Pereira.)
Pereira
– Houve autorização verbal do diretor-geral. Verificada a incorreção jurídica da autorização verbal, foi convalidado o ato.
Adauto – Isso é uma rotina para o processo não ficar parado só porque faltou um diretor. Isso é normal.
L.C.C. e W.D.