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A EDUCADA
Renata Piscitello, 29 anos, pouco experiente na arte da conquista

 

Para alguns, é um hábito tão arraigado quanto escovar os dentes, tão simples como calçar os sapatos, tão natural quanto comer ou respirar. Para outros, pressupõe horas de maquinações intelectuais, noites insones e infindáveis hesitações. O ato de paquerar pode ser fonte de prazer ou sofrimento. Também pode ter vários significados, dependendo de quem o pratica, e outras tantas variáveis, inclusive externas, como, por exemplo, o cenário onde está se desenhando o flerte. E é rito obrigatório de passagem para um relacionamento estável. Diante da magnitude do tema e imerso em todas essas questões, um grupo de pesquisadores da Universidade do Kansas, nos Estados Unidos, decidiu mapear os estilos universais de paquera.

Em um levantamento feito com cinco mil pessoas e publicado na edição de dezembro da revista científica “Communication Quarterly”, a equipe do doutor em comunicação humana Jef­frey Hall identificou cinco grandes estilos de paquera e criou um método para que qualquer um possa determinar o seu (faça o teste na pág. ao lado). A partir dos dados, foram estabelecidas ainda as perspectivas de relacionamento associadas a cada perfil e as interações entre os estilos (leia quadro na página 114). “Todos nós já demos ou recebemos cantadas e nos surpreendemos com reações positivas e negativas, tanto nossas quanto de quem paqueramos”, disse Hall à ISTOÉ. “Com o estudo, esperamos ajudar as pessoas a entender o que dá certo, com quem dá certo e por que dá certo”, diz. “E errado também.” Durante o desenvolvimento do trabalho, os estudiosos observaram, ainda, que a forma como as pessoas paqueram é um espelho de como elas se comportam num relacionamento amoroso.

Embora o teste desenvolvido pela equipe da Universidade do Kansas determine o estilo do paquerador, o resultado é o retrato de um momento e muitas vezes caduca. A chegada da idade, por exemplo, aumenta a incidência dos perfis tradicionais, sinceros e educados e diminui a dos tipos brincalhões e físicos. “Como essa é a primeira vez que fazemos a pesquisa, não temos base para comparar a evolução nos perfis, mas sabemos que ela existe”, afirma Hall. A coor­denadora pedagógica paulistana Greice de Cavalcante, 35 anos, estilo sincero, atribui o resultado do teste, em parte, à sua idade. Greice acha que já pertenceu a outros perfis, mas sente que amadureceu e hoje sabe bem o que quer – uma das características mais fortes dos sinceros. “Eu não gosto de perder tempo”, diz. “Se tenho interesse demonstro; se não tenho, não tomo iniciativa e logo corto as eventuais investidas.”

Boa parte dos comportamentos na hora da paquera é aprendido, e não instintivo. Segundo Araceli Albino, psicóloga e presidente do Sindicato dos Psicanalistas do Estado de São Paulo, esse processo de aprendizagem começa na primeira infância, mais precisamente entre os sete e os oito anos. É o momento em que a linguagem e o raciocínio abstrato começam a fazer parte da vida dessa criança. “A relação de dependência com os pais passa a fazer mais sentido e a criança desenvolve amor por sua família”, explica Araceli. Embora os objetos de amor nessa fase sejam limitados e, de certa maneira, impostos, essas primeiras relações vão nortear boa parte das interações carinhosas durante a vida de uma pessoa. “Quando chega a hora de escolher, a pessoa o fará com os alicerces que estabeleceu na infância misturados com as influências da adolescência.” Não há, porém, determinismo, como os especialistas da Universidade do Kansas e a própria Greice comprovam ao reconhecer que existem mudanças no estilo de flerte. Mas o legado amoroso da infância age como pano de fundo para as relações futuras.

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É de supor, portanto, que o analista de tendências de mercado paulistano Hernando Gouveia, 28 anos, tenha tido uma infância leve e divertida. Extrovertido e bom de papo, ele fez o teste e descobriu o que já sabia: tem o estilo brincalhão. “Levo a vida de um jeito leve, era natural que isso se transferisse para meu modo de paquerar”, diz. Para ele, uma das grandes vantagens de brincar na hora da conquista é ter uma forma elegante e rápida de sair das eventuais saias-justas. “Mas tomo cuidado para não ficar com jeito de bobo – piada demais também não é bom”, diz.

Freud explica o comportamento de Gouveia. Segundo os psicanalistas, quem excede nas piadas na hora da conquista muitas vezes o faz para camuflar a timidez. O humor ameniza a tensão do flerte, mas em excesso pode ser um problema. É comum, por exemplo, que o paquerador brincalhão não seja levado a sério e se encaixe na categoria de conquistador serial desinteressado em relações mais longas. Gouveia garante que não é esse o seu caso, mas conta que já namorou quatro vezes e os relacionamentos nunca duraram mais de dois anos. “E sempre tinha algo em vista, mesmo quando namorava”, confessa. Aos que são rápidos para começar a julgar, Araceli explica que, no amor e, consequentemente, na paquera não existe perfil melhor que o outro. “Eles devem ser lidos apenas como diferentes”, explica.

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A SINCERA E O BRINCALHÃO
Se tem interesse em alguém, Greice de Cavalcante, 35 anos, demonstra.
Já Hernando Gouveia (abaixo), 28, usa o humor para fugir das saias-justas

 

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Para a arquiteta carioca Renata Piscitello, 29 anos, porém, a ideia de ter muitos casos engatilhados não faz sentido. “Se é para namorar, o negócio é namorar direito”, afirma ela, perfil educado. Segundo o pesquisador Hall, o educado e o tradicional são tipos mais comuns entre aqueles que saíram recentemente de um relacionamento amoroso mais estável. A teoria se confirma na prática no caso de Renata. Seu último namoro durou mais de cinco anos. “Também não sou de sair na noite”, afirma a arquiteta, revelando uma característica comum ao estilo dela, que prefere qualidade à quantidade nas abordagens que recebe. Com os diagnósticos, esses três solteiros passaram a se conhecer melhor. Nada que garanta o acerto nos próximos relacionamentos, mas já é uma luz nas incertezas do jogo amoroso.

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