i50585.jpgSurge a conexão entre dois escândalos. A Receita Federal e o Banco Central já sabem que boa parte das pessoas que fizeram aplicações no Opportunity Fund enviou dinheiro para o Exterior pela conta Beacon Hill, a mesma utilizada no esquema do banco Banestado, de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O caso Banestado foi investigado pela Polícia Federal na Operação Farol da Colina, uma tradução de Beacon Hill para o português. A Beacon Hill é uma agência de investimento que teria lavado, junto com o Banestado, cerca de US$ 30 bilhões em quatro anos. A conta da agência é algo que no mercado financeiro recebe o apelido de "conta-ônibus", uma espécie de conta maior que engloba inúmeras subcontas. O que o BC e aReceita já sabem é que a mesma conta-ônibus serviu para operações dos investidores do fundo do Opportunity. Da mesma forma que aconteceu no esquema do Banestado, o fundo do Opportunity só poderia ter sido usado para operações de não-residentes no Brasil. Esse é o princípio da irregularidade, à qual se somam suspeitas de sonegações e omissões à Receita e ao Banco Central.
A identificação de todos esses investidores e das irregularidades que cometeram é o cerne da segunda fase da Operação Satiagraha. A Receita vai instaurar nos próximos dias um processo administrativo para cada suspeito de ligação com o banqueiro e para cada correntista que aparece na quebra de sigilo do disco rígido (HD) do Opportunity Fund. A devassa fiscal e financeira deve atingir algumas centenas de pessoas e empresas. Só a irmã do banqueiro, Verônica Dantas, é sócia de 150 empresas ligadas ao Grupo Opportunity.
Boa parte das pessoas que enviaram dinheiro via Beacon Hill aplicou no fundo de Dantas no Exterior, segundo fontes da cúpula da Receita. Alguns desses brasileiros enviaram dinheiro de caixa 2 via doleiros e Banestado. Lá fora, o dinheiro foi aplicado no Opportunity Fund. A investigação da conta Beacon Hill já permitiu à Receita multar alguns investidores que agora aparecem no fundo do Opportunity. O cruzamento das informações de cada uma das operações gerará novas punições. A investigação dos sócios e clientes de Dantas mobiliza toda a inteligência da Receita, pois será feita de forma rápida. Boa parte das movimentações do HD é de 2003, e a Receita só tem até o fim do ano para intimar os suspeitos e instaurar processo administrativo. O prazo máximo da Receita para processar débitos tributários é de cinco anos.
i50586.jpgCom base nos primeiros levantamentos, técnicos da Receita disseram à ISTOÉ que Daniel Dantas deverá receber uma multa astronômica. Como exemplo, um único ano: em 2004, Dantas tinha um saldo pessoal nas suas contas bancárias de R$ 1,18 bilhão, mas declarou somente R$ 302 milhões ao Imposto de Renda. Caso a Receita conclua pela existência de dolo, a multa chega a 150% para cada real não declarado. Situação pior deve enfrentar a mulher de Dantas, Maria Alice Carvalho Dantas. No mesmo período, ela movimentou R$ 576 milhões e declarou à Receita apenas um centavo. Resultado: se ao final das investigações, a Receita concluir que houve fraude e dolo e se os advogados de Daniel Dantas não conseguirem provar o contrário na sua defesa, ela poderá vir a pagar uma multa de nada menos que R$ 1,6 bilhão.
No Banco Central, corre um processo administrativo sigiloso contra o Opportunity. Segundo publicou o jornal O Estado de S. Paulo, o BC investiga suposta lavagem de dinheiro, a partir dos indícios recolhidos numa fiscalização feita em 2007 pelo Departamento de Combate a Ilícitos Financeiros e Supervisão de Câmbio e Capitais Internacionais (Decic). Anexados à Operação Satiagraha, os documentos do BC detalham movimentações da mulher de Dantas. Neles, Maria Alice declara ter uma renda mensal de R$ 1.468 e patrimônio de R$ 60 mil. Mas o Decic descobriu que, em 2005, ela movimentou R$ 21,5 milhões e teve aplicações de R$ 830 milhões. Sua conta, na verdade, era operada por Itamar Benigno Filho, que respondia pela área comercial e integrava o comitê de auditoria do Opportunity. Itamar foi um dos presos da Satiagraha.
A forma como atua o Opportunity, com o emaranhado de empresas que o grupo cria e desfaz, chama a atenção da Receita. No entender da Polícia Federal, Dantas age assim justamente para dificultar o acompanhamento da sua atuação pelos organismos de fiscalização. Nesse sentido, há um curioso personagem que virou sócio de Dantas em diversas empresas. Eduardo Duarte, um advogado de 62 anos, é uma espécie de incubadora profissional de negócios: vive de criar empresas para repassá-las a outros empresários. No caso de Dantas, ele tornou-se sócio do Opportunity nas empresas Caraíva Participações, Bilimbi Participações, 121 Participações e XX de Novembro Securitização. Procurado por ISTOÉ, Duarte confirma que sua vida é mesmo "fazer" empresas. "Eu faço, deixo com as obrigações fiscais em dia e vendo para os clientes. No meu nome, eu já tive mesmo mais de 700 empresas, e o Dantas comprou algumas delas", diz ele. Duarte, no entanto, repele a pecha de laranja. Afirma que, ao contrário do que diz a PF, não é mais sócio das empresas que estão com Dantas. "Se você vende um carro para alguém e o cara sai matando pelas ruas, você não pode ser acusado por isso", defende-se.
Em outro front do cerco a Dantas, está a acusação de tentativa de suborno do delegado Victor Hugo Rodrigues Alves Ferreira. Na quarta- feira 16, o juiz Fausto De Sanctis acolheu denúncia contra Daniel Dantas, Humberto Braz e Hugo Chicaroni por corrupção ativa. Na versão divulgada por seus advogados, Dantas diz que nunca soube da tentativa de suborno, ocorrida no restaurante uruguaio El Tranvia, em São Paulo. Uma troca de e-mails entre Verônica Dantas, irmã e sócia de Dantas, e a advogada Danielle Silbergleid, assessora jurídica do Opportunity, no entanto, revela que o comando do banco sabia do passo a passo da oferta de suborno ao delegado. De Porto Rico, onde estava negociando fazendas para a produção de cacau, Verônica mandou um e-mail para Danielle: "Graças a Deus que nós conseguimos comprar aquele delegado babaca, que não sai do nosso pé."


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