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POMPA
Com Lula, Dilma é recebida como chefe de Estado

 

Um vento gelado invade o lobby do clássico Imperial Palace Hotel, um dos melhores cinco-estrelas de Seul. São três e meia da tarde da sexta-feira 12 e a porta da frente está aberta para a chegada de uma autoridade. A presença de seguranças e militares armados contrasta com a delicadeza do vestido cor-de-rosa de Julie, uma bela recepcionista coreana destacada somente para dar as boas-vindas aos hóspedes vips que passam por ali. Minutos depois, entra Dilma Rousseff. A presidente eleita do Brasil acaba de acompanhar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva na reunião de cúpula do G20, na qual foi apresentada aos mandatários de 20 paí­ses desenvolvidos e emergentes, como o americano Barack Obama e o chinês Hu Jintao. Cabeça erguida, ela passa rapidamente pelo hall e some no elevador que estava à sua espera, rumo à suí­te presidencial. Nem deu tempo de apreciar as delicadas porcelanas japonesas e inglesas do início do século passado, em exposição permanente sobre móveis antigos do hotel. A seis semanas da posse, Dilma já é tratada e se porta como aquilo que é: uma das mulheres mais poderosas do mundo.

A presidente eleita estreou no cenário externo justamente no último grande evento internacional do presidente Lula. O G20 é o grupo de elite dos países mais influentes da nova ordem econômica mundial, retrato de uma era marcada pelas dificuldades dos desenvolvidos e pela pujança econômica dos antigos emergentes, que agora começam a ser chamados de “países de alto crescimento”. Os presidentes dos Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Reino Unido e Itália sentam lado a lado com os colegas do Brasil, da China, Rússia e Índia. Também participam os líderes da Coreia do Sul, da Argentina, da Austrália, da Turquia, do México e da Arábia Saudita, entre outros. Não foi por acaso que Lula escolheu esse fórum para exibir o troféu de sua sucessão. Dilma, prometeu o brasileiro aos colegas, não irá decepcioná-los. O Brasil está na melhor fase em décadas e Dilma já faz parte dessa história de sucesso, disse ele. “Estou tranquilo. O G20 nem sentirá falta do presidente Lula porque ela fará muito mais bonito”, afirmou, diante do olhar sisudo da eleita. “Agora, faltando um mês e meio, só cabe torcer para que ela monte um grande governo e possa ter mais sucesso do que eu tive”, afirmou.

Em sua passagem por Seul, Dilma mostrou-se um pouco tensa, quem sabe sentindo o peso da responsabilidade que se aproxima. Na manhã da sexta-feira, antes de sair ao encontro de cúpula, ela comentou o primeiro pensamento que teve nos macios travesseiros do hotel Imperial Palace: “O que penso todo dia quando eu acordo é que tenho de desempenhar esse papel para o qual fui eleita. É uma missão que vou desempenhar e levar a bom termo.” Dilma tomou o cuidado de não ofuscar o brilho de Lula, que há dois anos, na cúpula do G20 em Londres, foi descrito pelo então recém-eleito presidente Barack Obama como “o cara”. Ela evitou aparições em público, deu duas rápidas entrevistas coletivas e falou somente com os jornalistas brasileiros que a aguardavam no hall do hotel.

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A revista americana “Forbes” a colocou em 16º lugar na lista das pessoas mais poderosas do planeta, aumentando a curiosidade dos presidentes do G20 sobre a próxima governante do Brasil. Na presença do mentor e padrinho político, recusou-se a vestir o papel de atração do encontro de cúpula. “Olha, eu acho que atração é o presidente no exercício do cargo. Presidente eleita não é atração, é notícia só.” Para não virar notícia na capital sul-coreana, Dilma despistou a imprensa na quarta-feira à noite e escapou para jantar no restaurante Bamboo House. Na quinta-feira, primeiro dia do encontro, achou tempo para uma rápida visita ao Palácio Imperial. Seu primeiro compromisso oficial foi o jantar no Museu Nacional da Coreia, onde Lula a apresentou a Obama e aos demais presentes. Nenhuma palavra vazou sobre as primeiras conversas de Dilma com os líderes do G20, ao contrário do que sempre costuma acontecer em grandes eventos desse tipo. Na manhã da sexta-feira, Dilma foi econômica nas declarações à imprensa antes de sair para as reuniões de trabalho do grupo, em companhia do presidente Lula. Mesmo assim, não se furtou a comentar o grande tema do momento, a chamada guerra cambial, na qual Estados Unidos e China são acusados de desvalorizar artificialmente sua moeda para fortalecer as exportações e crescer à custa de outros países. O Brasil é uma das vítimas colaterais dessa guerra – o real é uma das moedas mais valorizadas do mundo, o que reduz a lucratividade das exportações e coloca alguns setores em dificuldade. Dilma não gosta do que vê nesse campo de batalha. "Isso não é bom para o Brasil. Vamos ter de olhar cuidadosamente, tomar todas as medidas possíveis", afirmou, sem dar maiores detalhes.

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PROTAGONISMO
Dilma é apresentada ao presidente francês, Nicholas Sarkozy, durante reunião do G20,
e recebida como chefe de Estado pelo presidente sul-coreano,
Lee Myung-Bak, ao chegar a Seul para o encontro mundial

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No geral, no entanto, o G20 não recomendou nenhuma grande medida para acabar com a guerra cambial. Falou-se apenas vagamente em criar, no primeiro semestre de 2011, “parâmetros indicativos” para medir os desequilíbrios das economias de alto crescimento. E foi sugerido que os países adotem taxas de câmbio de mercado, numa suave pressão para que a China, que tem o câmbio controlado, permita a apreciação do renmimbi. Traduzindo em miúdos, a guerra cambial vai continuar no primeiro ano do governo Dilma, provocando uma incômoda instabilidade na economia global. Isso não é o fim do mundo, mas certamente não é bom para o Brasil. A diferença é que, a partir de janeiro, ela vira autoridade de fato e o problema também será todo dela.

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