chamada.jpg
TENSÃO
Silvio Santos passou as últimas semanas negociando uma forma de salvar o banco.
Segundo fontes, ele nunca esteve tão preocupado

 

Poucas trajetórias empresariais no Brasil são tão espetaculares quanto a do apresentador de televisão Silvio Santos. O ex-camelô que vendia canetas-tinteiros e capas de plástico para documentos construiu, em seis décadas, um império com vendas anuais de R$ 7,7 bilhões, valor que o coloca entre os 60 maiores conglomerados do País. Suas empresas atuam em setores diversos como comunicação, hotelaria, financeiro e de cosméticos e empregam mais de oito mil pessoas. A emissora que Silvio controla, o SBT, chegou a ser a principal rival da Rede Globo e fez dele um homem tão conhecido quanto admirado. Como pessoa física, nenhum brasileiro paga mais Imposto de Renda que Silvio. Nas últimas semanas, porém, o empresário do sorriso fácil e de imenso carisma tem andado preocupado. Ele se tornou um frequentador assíduo do 12º andar de um prédio localizado no número 210 da avenida Faria Lima, em São Paulo. Afinal, todo o seu patrimônio estava em jogo naquela sala, sede do Fundo Garantidor de Créditos (FGC). Criado para cobrir perdas de correntistas em caso de quebra de alguma instituição, o FGC concedeu empréstimo de R$ 2,5 bilhões (leia quadro na página 96) para salvar da bancarrota o banco Panamericano, que tem Silvio como um de seus principais acionistas. O socorro, feito com dinheiro privado, foi necessário depois que o Banco Central descobriu indícios de fraude nas operações do banco, que resultaram em um rombo bilionário. “Foi uma fraude sofisticada, que utilizou instrumentos sistemáticos de registros irregulares”, disse à ISTOÉ o diretor de fiscalização do Banco Central, Alvir Hoffmann.

G_Panamericano.jpg
MODELO
Criado por Silvio, o Panamericano cresceu vendendo crédito pessoal

 

Acredita-se que nos últimos quatros anos a diretoria do Panamericano vendeu, legalmente, carteiras de crédito a outras instituições. O problema é que os diretores do banco não deram baixa dos valores em seu patrimônio. Em vez disso, continuaram contabilizando os recursos, calculando lucros sobre eles e, incrivelmente, deixando que o Panamericano vendesse o que não tinha para outros bancos. A maquiagem de dados não foi notada pela Deloitte, auditoria responsável pela análise dos balanços do banco e que, este ano, deverá receber R$ 1,13 milhão pelos serviços prestados à instituição. O esquema só foi identificado por técnicos do BC há seis semanas, quando estavam sendo conferidos financiamentos vendidos pelo Panamericano. “A fraude começou com valores pequenos, que foram se inflando ao longo do período”, diz Hoffman. “Ela passou despercebida até o momento em que nós avaliamos as operações e cruzamos as informações. Não houve falha na fiscalização, nem nos processos”, afirma Hoffmann. O BC também constatou outra frente de erros contábeis que poderiam propiciar desvio de recursos. O presidente do BC, Henrique Meirelles, disse, em audiência no Congresso, que R$ 400 milhões do rombo do Panamericano foram originados por problemas com operações de cartão de crédito. Há indícios de que a administradora decartões do grupo registrou como receita própria recursos vindos de pagamentos de faturas pelos clientes às lojas.

img.jpg

“O Banco Central constatou sérias distorções. Vamos investigar até o fim”
Luiz Sandoval, presidente do Grupo Silvio Santos

 

O buraco bilionário deixa uma série de dúvidas. No final de 2009, o Panamericano foi minuciosamente auditado pela Caixa, que pagou R$ 739,2 milhões por 49% do capital social votante e 20,69% das ações preferenciais. Além disso, a negociação foi aprovada pelo BC no último passo para a finalização da operação. Além da Delloite, o Panamericano também passou pelo crivo da KPMG, do banco Fator, instituições de boa reputação no mercado financeiro. Por que nenhuma delas percebeu nada? É difícil pensar em má-fé, hipótese que faria imaginar que todas agiram em conluio. O mais provável é uma barbeiragem nos métodos de aferição de balanços.

img1.jpg
DEMITIDO
Nos últimos dias, oito diretores do banco Panamericano caíram,
inclusive o presidente, Rafael Palladino

 

Um dos motivos da diretoria do Panamericano para maquiar a contabilidade era mostrar uma instituição saudável, o que resultaria em gordos bônus para seus executivos. Segundo fontes do mercado, eles poderiam chegar a R$ 1 milhão para cada diretor de primeira linha. “Não sabemos quem são os responsáveis”, diz Luiz Sandoval, presidente da holding do Grupo Silvio Santos. “O Banco Central constatou inconsistências contábeis, que geraram sérias distorções. Não deixarei de investigar até o fim”. Nos últimos dias, oito diretores do Panamericano caíram, inclusive o presidente, Rafael Palladino. O jornal “Valor Econômico” revelou que nos meses de setembro e outubro, o ex-diretor financeiro do Panamericano Wilson Roberto de Aro adotou várias medidas para “blindar” seu patrimônio pessoal. Aro, destituído na semana passada de seu cargo, criou empresas e alterou o registro de imóveis para evitar penhoras em caso de dívida.

Enquanto os culpados não aparecem, Silvio deu uma demonstração impressionante de confiança no futuro do banco. Ele apresentou como garantia do empréstimo feito junto ao FGC as outras empresas que fazem parte de seu conglomerado (leia quadro na pág. 94). “A holding só recebeu R$ 2,5 bilhões porque eu dei todos os meus bens em garantia”, disse Silvio numa entrevista ao jornal “Folha de S. Paulo”. Ele admite que não acompanhava de perto a administração do Panamericano. “Nunca fui ao banco. Nem sei onde é o prédio”, afirmou. Silvio se define como um investidor que sempre aplica no mercado brasileiro. “Eu boto dinheiro, pago bem os profissionais e eles têm de me dar resultados. E, às vezes, falham. Desta vez, falhou.” O empresário, que vai completar 80 anos em dezembro, já admite se desfazer de parte de suas empresas para cobrir o empréstimo com o FGC. “Se me pagarem bem, por que não?”

img2.jpg