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DESAFIO
Dilma afirma que um dos seus principais objetivos,
se eleita presidente, é erradicar a miséria

 

A revista ISTOÉ elaborou uma entrevista com as mesmas 15 perguntas para os dois presidenciá­veis – tratando de temas relevantes para o País, como emprego e educação – com o compromisso de democraticamente abrir o mesmo espaço para suas ideias. O candidato
José Serra preferiu não responder. A candidata Dilma Rousseff concedeu a entrevista e a seguir publicamos o seu teor.

ISTOÉ – O Brasil cresce hoje a 7%. O que esperar dos próximos quatro anos?
Dilma Rousseff –
Nos últimos oito anos, abriu-se uma nova era de prosperidade para o Brasil. Temos uma política econômica que vem dando resultados altamente positivos, com crescimento do PIB a taxas inéditas no País e com distribuição de renda. O Brasil está perto de se tornar uma das maiores potências mundiais. No meu governo, se eleita, seguirei a trajetória do presidente Lula, que criou 15 milhões de empregos com carteira assinada, reduziu a informalidade, aumentou e recuperou o poder de compra do salário mínimo, ampliou o crédito e o consumo interno, estabeleceu uma política de investimentos públicos e privados, deu estabilidade macroeconômica. Colocou o Brasil num novo patamar mundial. Mas trabalharei incansavelmente para erradicar a miséria. Já fizemos muito para chegarmos a esse objetivo, 28 milhões de pessoas saíram da linha da pobreza e outras 36 milhões ascenderam à classe média.

ISTOÉ – Há anos o Brasil sofre com uma elevada taxa de juros. O que fazer para baixá-la?
Dilma –
Temos conquistado, progressivamente, taxas de juros reais menores ao longo do tempo. Eram 16% no início de 2003 e chegamos a menos de 6% nos últimos meses. Concordo que é preciso baixar mais, mas isso, infelizmente, não se consegue só com boa vontade. É preciso reunir condições para isso. Estamos aumentando o investimento e reduzindo a dívida pública. Isso permitirá uma redução adicional na Selic, que, por sua vez, diminuirá a pressão atual pela apreciação do real. Outro fator que permite a redução, sem comprometer o controle da inflação, é o crescimento da nossa produtividade.

ISTOÉ – Qual deve ser o perfil do seu futuro ministro da Fazenda?
Dilma –
Não se fala em cargos e perfis, sem saber o resultado das urnas.


ISTOÉ – O BC deve continuar autônomo em relação à Fazenda?
Dilma –
O Banco Central brasileiro tem autonomia operacional e isso deu muito certo. Acho que o BC é o seguinte: autonomia operacional e status ministerial no que se refere ao seu presidente.

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ISTOÉ – O País tem uma das maiores cargas tributárias do mundo. Como diminuir o peso dos impostos na produção e no consumo?
Dilma –
O principal foco da reforma tributária deve ser o de simplificar e racionalizar a arrecadação de impostos. Avançamos muito nos últimos anos, com desonerações e ampliação de sistemas tributários simplificados, como o Super Simples. Ainda assim, as empresas brasileiras gastam muito tempo e recursos para pagar impostos e o governo também gasta muito tempo e recursos para arrecadar e fiscalizar os impostos. Assim, minha proposta de reforma tributária vai priorizar o aumento na eficiência produtiva, tanto do ponto de vista das empresas quanto do governo. Alguns impostos podem e devem ser reduzidos, como a contribuição sobre a folha de pagamentos, serviços públicos essenciais, remédios e investimentos. Vou também construir um sistema de devolução automática de créditos, em acordo com os governadores, envolvendo os impostos e as contribuições federais e estaduais, pois um crédito não devolvido é um tributo pago indevidamente.

ISTOÉ – O Brasil precisa garantir melhor qualidade ao sistema público de saúde. É possível fazer isso sem recriar a CPMF? Como?
Dilma –
Se eleita, vou construir a estrutura definitiva do SUS, o que requer financiamento compatível com suas necessidades. Vou apoiar a regulamentação da Emenda Constitucional nº 29 para fixar novos patamares de vinculação da receita e definir o que são ações e serviços públicos de saúde. Promoveremos maior equidade na distribuição dos recursos federais e estaduais para a saúde utilizando critérios epidemiológicos, de rede instalada, renda per capita, IDH e outros para corrigir as desigualdades. Aperfeiçoaremos os mecanismos de acompanhamento, monitoramento e controle social dos recursos do Ministério da Saúde e os transferidos a Estados e municípios, priorizando o combate ao desperdício e a desvios.

ISTOÉ – Quais são seus planos para o Mercosul?
Dilma –
O Mercosul é uma realidade histórica com quase 20 anos de existência. Todas as iniciativas devem ser voltadas para o seu fortalecimento, não para a sua morte. Com a multipolarização do mundo, os problemas encontram cada vez mais soluções de natureza regional. É assim na Ásia, na América ou em outras regiões. Vale para questões econômicas, ambientais ou de segurança. Os últimos anos do Mercosul foram marcados por um extraordinário incremento comercial. A crise global, que abateu especialmente a indústria, afetou as transações comerciais. Mas em 2010 observamos uma forte recuperação. O fortalecimento institucional do Mercosul e uma integração produtiva maior devem fazer parte de uma agenda para o Mercosul.

“Acho que o BC é o seguinte: autonomia operacional e
status ministerial no que se refere ao seu presidente”

ISTOÉ – Como evitar que nossa Previdência Social entre em colapso, como acontece agora na Europa?
Dilma –
Não precisamos de uma grande reforma na Previdência. Se houver necessidade, poderão ser realizados ajustes pontuais, para adaptar a estrutura de aposentadorias e pensões às novas realidades da economia e da sociedade.
 

ISTOÉ – O que fazer para melhorar o padrão educacional do Brasil?
Dilma –
O grande salto para um país verdadeiramente desenvolvido é a educação de qualidade, desde a creche até a pós-graduação. E tenho absoluta convicção de que não chegaremos a este lugar se não investirmos fortemente no professor, na sua carreira, na sua formação, no seu salário. Este será um dos grandes investimentos de meu governo, se for eleita.
 

ISTOÉ – Hoje o Brasil bate recordes na geração de empregos. Qual a sua política para manter esse ritmo?
Dilma –
A taxa de desemprego de 6,9% aponta para um quase pleno emprego. E isso graças aos sucessivos recordes de geração de empregos nos últimos anos. Vamos fechar em algo em torno de 15 milhões, com carteira assinada. A receita para continuar gerando empregos é: fortalecer as políticas sociais; continuar investindo em infraestrutura; estimular a produção; apoiar o agronegócio e a agricultura familiar; fortalecer as micro e pequenas empresas. E manter as políticas sociais que estimulam o consumo das famílias, além da política de valorização do salário mínimo. Mas tenho duas propostas que serão decisivas para avançar ainda mais: a desoneração da folha de pagamentos, reduzindo a alíquota de contribuição patronal, o que beneficiará principalmente os setores intensivos em mão de obra, como calçados, alimentos, têxteis; e a criação do Ministério das Micro e Pequenas Empresas, que permitirá aprimorar todas as políticas voltadas a este segmento, dando-lhe mais competitividade e, desta forma, ampliando a capacidade da economia brasileira de gerar empregos de qualidade.
 

ISTOÉ – Como será a relação do governo com o MST?
Dilma –
Como foi no governo do presidente Lula, sempre com diálogo. Nós não tratamos movimentos sociais com cassetete nem com repressão. Não apoiamos nenhuma ação que fuja da legalidade, mas também não fechamos as portas do diálogo para resolver conflitos.
 

ISTOÉ – Como preservar o meio ambiente fazendo o Brasil crescer?
Dilma –
No governo Lula, demonstramos que é possível crescer, distribuir renda e ser ambientalmente sustentável. Este é o modelo de desenvolvimento que perseguimos e que continuarei perseguindo. Tenho proposta clara para o desenvolvimento sustentável do Brasil. Entendo ser fundamental, por exemplo, avançar na agenda da sustentabilidade em todos os segmentos de políticas públicas. No PAC 2 já previmos investir R$ 9,7 bilhões no período 2011-2014 em fontes alternativas de geração de energia, em especial eólica e biomassa. Temos o compromisso com a implementação da Política Nacional de Mudanças Climáticas e vamos consolidar os acordos setoriais no âmbito do Plano Nacional de Mudanças Climáticas. O grande avanço que tivemos nesses oito anos e que continuará sendo a marca da nossa gestão, se eleita for, é a vinculação da questão social e da ambiental. Consolidar este modelo de desenvolvimento nos levará a uma situação de maior justiça social, valorização dos nossos recursos naturais e preservação da nossa biodiversidade.
 

ISTOÉ – É necessária uma mudança na matriz energética brasileira?
Dilma –
O governo Lula deixará um legado importantíssimo para os quatro anos do próximo governo, que é a contratação de 100% da oferta necessária para atender à demanda de energia elétrica no Brasil, com o País crescendo a taxas desejáveis. Não farei diferente. A minha experiência no setor – que é grande – mostra que a política de geração de energia elétrica no Brasil deve sempre priorizar, como fizemos no governo Lula, a modicidade tarifária, a segurança do abastecimento e uma matriz energética renovável. Lembro que uns 47% de toda energia que produzimos no Brasil é proveniente de fontes renováveis, com destaque para a hidreletricidade, os biocombustíveis e as energias alternativas – biomassa, pequenas centrais hidrelétricas e eólica. É sempre bom lembrar que a hidreletricidade abasteceu 85% de nossa demanda de energia elétrica em 2009. E só utilizamos um terço do potencial energético de nossos rios para a geração de eletricidade, o que significa que temos todas as condições para manter elevada a participação das energias renováveis nos próximos anos, principalmente com a entrada em operação das hidrelétricas do rio Madeira e de Belo Monte. A fonte hidráulica, tão abundante em nosso país, com toda certeza terá papel preponderante na próxima década. Todavia, para que aproveitemos de forma racional as características dessa energia, será preciso completá-la com fontes alternativas também renováveis.

“Alguns impostos podem e devem ser reduzidos,
como a contribuição sobre a folha de pagamentos,
serviços públicos essenciais, remédios e investimentos”


ISTOÉ – A ONG Transparência Internacional mostra que o Brasil ocupa uma vergonhosa 69º posição no ranking da percepção de corrupção. O que fazer para mudar isso?
Dilma –
Não vou vender para a população a ideia de que as coisas são perfeitas e de que não vai acontecer nada. Um governo se mede pela capacidade que tem, não de garantir que não haja nada, mas de, em havendo, tomar providências, investigar e punir. O governo do presidente Lula não foi – e o meu, caso eleita, não será – um engavetador de denúncias, como aconteceu no passado. É importante lembrar, também, que fortalecemos e valorizamos os órgãos investigativos, como a CGU e a Polícia Federal.
 

ISTOÉ – Qual a melhor maneira de enfrentar o déficit habitacional brasileiro? Construindo casas populares ou facilitando o crédito para a população de baixa renda? 
Dilma –
Com o Minha Casa Minha Vida, que terá atenção especial em meu governo. Nós retomamos no País o papel do Estado na política habitacional, por meio desse programa. Se os mais pobres não têm condições de pagar a prestação de uma casa própria, o Estado tem que subsidiar. Mas esta é uma política também para reaquecer o setor da construção civil, que é grande empregador. Vamos continuar nessa linha, mantendo crédito e financiamento. Fizemos o Minha Casa Minha Vida, que coordenei pessoalmente como ministra-chefe da Casa Civil, e já temos prevista a segunda edição do programa para o período 2011-2014. Serão construídos dois milhões de moradias com investimentos de R$ 71,7 bilhões. É importante lembrar que 60% das unidades habitacionais serão destinadas a famílias com renda de até 2,4 salários mínimos.

 


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