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Na maior parte da cidade de Copiapó, no norte do Chile, o ambiente é de festa e expectativa para receber os mineiros, presos no subsolo há mais de dois meses. Porém, entre bairros inteiros decorados com bandeiras, uma residência se mantém do mesmo jeito de antes: é a casa de Marta Salinas Cabello, mulher do mineiro Jhonny Barrios há 28 anos.

Trabalhando no modesto armazém que tem em seu domicílio, Marta diz que não pretende "ver o resgate nem pela TV". Enquanto mostra as mais de 60 cartas que Barrios a enviou, a mulher não esconde a frustração pelo momento em que passa.

"Estou feliz porque ele está vivo, é um milagre de Deus, mas não vou assistir ao resgate. Ele me pediu, mas também convidou outra mulher com quem ele está agora, e eu tenho decência. A coisa é clara, ela ou eu", disse Marta. "Nem na televisão eu vou assistir, as conversas pelo telefone e por cartas bastam e isso é suficiente para mim", afirmou ela.

O caso de Jhonny Barrios não passou despercebido pelas autoridades nestes dois meses. Até a primeira-dama chilena, Cecilia Morel, preocupou-se com a situação de Marta Salinas.

É verdade, na visita de fim de semana tivemos uma reunião particular em que ela me ajudou psicologicamente", disse Marta. "Ela se pôs no meu lugar, a presidência conhece o meu problema e me disseram que não era má a minha decisão de não ir, de deixar que ela (nova parceira de Barrios) vá tranquilamente. Isso é amor", afirmou a mulher, que diz saber perfeitamente quais seus direitos de casada.

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Espetáculo do resgate

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O acampamento Esperança é como uma grande maré humana sob uma temperatura de 30°C ao meio-dia no deserto chileno, e deverá receber 3,5 mil pessoas durante o resgate dos 33 mineiros, que estava previsto para começar à 0h de quarta-feira, mas pode ser antecipado para as 20h de desta terça-feira.

"Atualmente há cerca de 2 mil pessoas, mas tem mais gente chegando. Receberemos entre 3,5 mil e 4 mil pessoas" para esta terça-feira, disse à AFP Mario Rozas, comandante da Polícia especial chilena, os Carabineiros.

A maior parte dos ocupantes do acampamento será de parentes dos mineiros e jornalistas de todo o mundo que estarão na cobertura do resgate dos 33 trabalhadores, presos há mais de dois meses a mais de 600 m de profundidade na mina San José.
Conforme foi se aproximando a data do resgate, o número de profissionais da informação também aumentou, com instalação de centenas de tendas.

Os últimos detalhes da operação estão sendo concluídos nesta terça-feira por socorristas e engenheiros. Cerca de 350 policiais se preparam para organizar a grande quantidade de pessoas e proteger os mineiros e seus familiares, impedindo a passagem de curiosos.
A falta de espaço fez com que vários jornalistas entrassem na barraca normalmente utilizada pelos parentes como refeitório. Sua presença incomodou os familiares. Por isso, depois de pedir que se retirassem, alguém escreveu em um cartaz a mensagem em inglês: "Please, do not use the eating area for work space" (Por favor, não usem o refeitório como área de trabalho)".

Operação

O içamento dos mineiros através de um duto de 622 m de comprimento e 66 cm de diâmetro tem riscos pela possibilidade de queda de pedras, mas também pela carga psicológica que a operação implica. Quando se aproxima o momento do resgate, aumenta o nervosismo. O processo inclui a subida de uma cápsula de 4 m de altura, com 450 kg, que percorrerá o equivalente a um prédio de 250 andares.

A expectativa, que vem crescendo entre os familiares e a opinião pública, é frequentemente contrariada pelo engenheiro-chefe do resgate, André Sougarret, que adverte sobre os riscos da operação. "Sempre há risco quando transportamos pessoas em um sistema vertical", disse ele na segunda-feira. "O risco tem a ver com a queda de pedras e que alguma das cápsulas fique presa. Mas temos mecanismos para soltá-las", afirmou Sougarret.

A viagem da cápsula

Para minimizar o risco de queda de pedras, foi decidido revestir o duto com tubos de metal nos primeiros 96 m, mas um problema com um dos canos forçou a redução do revestimento para 56 m. Apesar disso, a cápsula foi testada na segunda-feira, descendo pelo duto por 610 m. Os resultados deixaram todos otimistas, segundo o ministro Laurence Golborne.


"A cápsula se comporta muito bem dentro do duto, se desloca bem com revestimento e sem revestimento. Não há nenhum movimento de balanço dentro da cápsula. Não há queda sequer de poeira dentro do duto", afirmou Golborne. De qualquer forma, há um mecanismo para o caso de a cápsula travar: o mineiro pode ativar uma alavanca que separa as partes superior e inferior do compartimento. A parte de baixo da cápsula desce com o mineiro, preso por cintos de segurança, até o abrigo.

Alguns especialistas recomendaram o revestimento total do duto. Mas segundo Omar Gallardo, professor de engenharia de minas da Universidade de Santiago, "o risco que poderia haver é a separação de uma rocha, mas a possibilidade é mínima". "Isso poderia trancar a cápsula", disse Gallardo à AFP. "O revestimento dos primeiros metros reduz esse risco; as pedras parecem estar muito firmes, por isso é preciso testar a cápsula várias vezes, para cima e para baixo", afirmou o professor.

Há poucos dias, o diretor do departamento de engenharia de construção na Universidade Central do Chile, Miguel Mellado, disse que "não revestir é extremamente inseguro para este resgate. Pedras poderiam se desprender, com um risco muito alto para aqueles que estão embaixo, o que poderia obstruir a via de resgate", disse ele.

Riscos para a saúde

O ministro da Saúde, Jaime Mañalich, acredita que o maior perigo é que os mineiros sofram um ataque de pânico durante a subida. "Isso pode ocorrer porque eles subirão em um veículo que se move através da rocha, e cujo fluxo não é simétrico, além de suportarem o calor de cerca de 30°C", disse o ministro.

Por causa das dificuldades previstas, os mais hábeis foram escolhidos como os primeiros para ser trazidos à superfície, pois eles podem relatar os problemas da subida e alertar aos demais. Nesta terça-feira, uma equipe de três psicólogos entregará aos mineiros uma lista com os quatro primeiros a sair e também com os nomes dos 10 seguintes, que são considerados os mais frágeis. Até agora, só foi anunciado que o último a sair será Luis Urzúa, 54 anos, que liderou o grupo após o desmoronamento.

Desmoronamento

Em 5 de agosto, um desmoronamento na mina San José, em Copiapó, deixou 33 trabalhadores presos em uma galeria a quase 700 m de profundidade. Após 17 dias, as equipes de resgate conseguiram contato com o grupo e descobriram que estavam todos vivos por meio de um bilhete enviado à superfície. A partir daí, começou a operação para retirá-los da mina em segurança.

A escavação do duto que alcançou os mineiros durou 33 dias. O processo terminou no sábado, quando os martelos das perfuradoras chegaram até o abrigo onde eles estão. Concluída esta etapa, as equipes de resgate decidiram revestir o duto – ainda que parcialmente – para aumentar a segurança antes de retirá-los. O içamento estava previsto para começar à 0h de quarta-feira, mas pode ser antecipado para as 20h de terça.

A cápsula Fênix, que será usada para içar os mineiros, tem 53 cm de diâmetro. Todo trajeto de subida durará cerca de 15 minutos, apesar de a operação de saída levar cerca de uma hora para cada mineiro. Durante todo o percurso de subida, eles terão suas condições de saúde monitoradas, usarão tubos de oxigênio e se comunicarão com as equipes da superfície por meio de microfones instalados nos capacetes.


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