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O eleitor brasileiro foi às urnas neste domingo 3 pouco disposto a promover mudanças. Na maior parte dos Estados do País, candidatos que tinham como principal plataforma de campanha a continuidade saíram-se vitoriosos ou seguiram para o segundo turno. Ao todo, 13 candidatos da situação elegeram-se ainda no primeiro turno, e outros cinco seguiram para a segunda etapa da disputa. Foi, de forma geral, uma eleição marcada pelo sentimento de bem-estar que arrebatou a população brasileira nos últimos anos, incentivado pelo ambiente econômico positivo, pelo crescimento da renda, pela expansão do crédito, enfim, pela melhora generalizada na qualidade de vida dos cidadãos. Raros foram os casos de governadores que buscavam a reeleição e não chegaram nem mesmo ao segundo turno, como Yeda Crusius (PSDB), no Rio Grande do Sul, e Carlos Gaguim (PMDB), no Tocantins. As eleições de 2010 não repetiram o fenômeno de 1986, quando o PMDB elegeu governadores de 21 dos 22 Estados brasileiros da época em função do sucesso do Plano Cruzado. Mas as urnas deixaram claro, uma vez mais, que o eleitor vota muito mais pensando em seu bem-estar do que de acordo com convicções ideológicas subjetivas.

Em 2010, 20 governadores tentaram a reeleição. Metade deles elegeu-se no domingo, em muitos casos, de forma folgada. Dos outros dez, seis ainda estão no páreo e podem ser reeleitos no dia 31 de outubro. Nos sete Estados onde o mandatário do poder local já não podia mais concorrer a uma nova legislatura ou simplesmente optou por não entrar na disputa, três candidatos que representam a continuidade se elegeram no primeiro turno. “Com exceção dos candidatos muito mal avaliados, aqueles que representam o continuísmo tendem a ganhar. Eles levam vantagem porque ganham o voto dos eleitores que estão satisfeitos com o status quo”, afirma o cientista político Gaudêncio Torquato, professor da Universidade de São Paulo.

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Foi o caso do governador Carlos Gaguim. Ele chegou à reta final da eleição marcado por uma série de denúncias de corrupção. Gaguim conseguiu impedir que notícias a respeito de uma investigação do Ministério Público Federal que o acusava de estar envolvido com corrupção fossem publicadas na imprensa local. Não adiantou. Acabou derrotado por Siqueira Campos (PSDB) no primeiro turno. A governadora Yeda Crusius também passou a campanha desgastada por uma série de denúncias de corrupção, malversação do dinheiro público e até casos de espionagem. Terminou com apenas 18,4% dos votos, ficando mais de seis pontos percentuais atrás de José Fogaça (PMDB). Tarso Genro, representante do partido que fez a oposição mais ferrenha nos quatro anos de governo de Yeda, conquistou a vitória no primeiro turno com mais de 54% dos votos.

Genro tinha a seu favor o fato de ter sido um dos principais ministros do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lhe dedicou apoio explícito e intenso. Mas isso não bastaria para elegê-lo. Em São Paulo, Estado onde Lula mais se empenhou para vencer as eleições estaduais, seu candidato, Aloizio Mercadante, nem ao segundo turno chegou. No maior colégio eleitoral do País o que contou mesmo foi o desejo do eleitor em manter no poder o mesmo partido político que o governa há 16 anos. Uma vez mais o PSDB venceu no primeiro turno, deixando claro que o apoio do presidente mais popular da história do país não é o suficiente para vencer essa onda de continuidade que marcou essas eleições. Geraldo Alckmin retorna ao Palácio dos Bandeirantes depois de comandar São Paulo durante cinco anos e perder as duas últimas eleições – a presidencial, em 2006, e a municipal, em 2008. “O domínio do PSDB em São Paulo se sustenta mais nas sucessivas administrações aprovadas pela população do que nos candidatos”, afirma o cientista político Alberto Carlos de Almeida, diretor do Instituto Análise e autor do livro “A Cabeça do Eleitor”.

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INCLUSÃO
No Tocantins, índios da etnia krahô vão
às urnas eleger seus representantes

Embora os tucanos também tenham vencido em Minas Gerais, a dinâmica eleitoral no Estado é um pouco diferente de São Paulo. Lá foi o prestígio do agora senador eleito Aécio Neves quem determinou o rumo das eleições. Antônio Anastasia, ex-vice de Aécio quando este era governador, venceu com 62%. “Anastasia é a Dilma do Aécio Neves”, acredita o cientista político Rubens Figueiredo, diretor do Centro de Pesquisas e Análises da Comunicação. “Aécio é para Minas o que Lula representa para o Brasil.” Anastasia assumiu o Estado em março, quando Aécio saiu para concorrer ao Senado. Desconhecido dos eleitores, Anastasia acabou mantido no Palácio Tiradentes graças à popularidade do ex-governador. “São Paulo e Minas mostraram sua vocação conservadora ao manterem o PSDB no poder”, diz o cientista político José Paulo Martins Júnior, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. “A classe média é mais forte nesses Estados e menos influenciada, portanto, por políticas de distribuição de renda.”

O Nordeste, portanto, foi onde as políticas sociais ampliadas pelo governo Lula tiveram mais impacto nestas eleições, tanto na presidencial quanto nas estaduais. Pernambuco talvez seja o melhor exemplo desse fenômeno que transformou o mapa político da região. No Estado natal de Lula e palco do lançamento de programas emblemáticos, como o Fome Zero, o candidato apoiado por Lula, o governador reeleito Eduardo Campos (PSB), foi aquele que teve a vitória mais folgada do País. Campos não só venceu no primeiro turno como teve nada menos do que 82,84% dos votos válidos. O segundo colocado na disputa, o ex-senador Jarbas Vasconcelos (PMDB), um ferrenho adversário de Lula no Senado, saiu das eleições com apenas 14% dos votos. Considerando a dilatada diferença, é quase possível tomar a liberdade de afirmar que Campos não foi eleito, mas sim aclamado.

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PRESSA
Em Benfica, no Rio de Janeiro,
eleitores correm para ser os primeiros a votar 

O senador Renato Casagrande, também do PSB, não estava disputando a reeleição, mas era o candidato do governador do Espírito Santo, Paulo Hartung, que não quis tentar um novo mandato, e obteve um percentual bem parecido ao de Eduardo Campos: 82,3%. Sua vitória demonstra que o desejo de continuidade não se apoia apenas em candidatos que já estavam no poder, mas principalmente naqueles que garantem dar seguimento ao projeto de governo em vigor. O PSB ainda conquistou mais um Estado, seguindo a mesma lógica. Cid Gomes, irmão do ex-ministro Ciro Gomes, foi reeleito com mais de 60% dos votos dos eleitores cearenses, assim como foi Sérgio Cabral, o governador carioca que conquistou 66% dos eleitores fluminenses. Em comum os três também tiveram o apoio explícito do presidente Lula. “Há uma onda governista do País que é bastante influenciada pelo clima nacional”, explica Gaudêncio Torquato.

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Santinhos de candidatos espalhados perto
de uma favela de Brasília

Mas, muito mais do que os resultados, o que ficou mais evidente nessas eleições foi o fato de o Brasil estar caminhando para um processo de bipartidarismo, fenômeno tão comum em democracias maduras. “Em grande parte do País, o primeiro e o segundo colocados receberam mais de 85% dos votos”, diz Alberto Carlos Almeida, diretor do Instituto Análise. “Isso é muito bom para a democracia. Mostra que estamos numa situação de bipartidarismo e que há dois lados fortes e competitivos. Significa que, se quem estiver no governo não trabalhar bem, a oposição estará pronta para assumir o poder na próxima eleição.” A democracia brasileira está saindo agora da adolescência – faz apenas 21 anos que o País voltou a escolher seu presidente pelo voto direto –, mas, como mostrou essa eleição, vem dando sinais mais do que claros de que chegou à maturidade.

Com reportagem: Adriana Nicacio, Alan Rodrigues, Cilene Pereira, Hugo Marques, Ivan Cláudio, Luciani Gomes, Natália Rangel, Patrícia Diguê, Rafael Teixeira, Solange Azevedo e Wilson Aquino