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Há uma revolução invísivel na medicina. As protagonistas dessa mudança são estruturas minúsculas, cerca de 90 mil vezes menores do que um fio de cabelo, conhecidas por nanopartículas. De tão pequenas, são visíveis apenas com a ajuda de microscópios ultrapotentes. Do mesmo modo que as famosas células-tronco, elas são responsáveis por avanços impressionantes nos tratamentos. Sem sombra de dúvida, pode-se afirmar que são um dos pilares de sustentação da medicina do século XXI. E o que é melhor: as pesquisas em nanobiotecnologia, como é chamado esse novo campo de estudo, se encontram em estágio avançado e começam a dar frutos. Um levantamento da agência internacional Thomson Reuters mostrou que, só no ano passado, foram requeridas no mundo mais de 300 patentes de produtos relacionados à saúde envolvendo nanotecnologia. O crescimento dessa área motivou o FDA, a agência reguladora de medicamentos dos Estados Unidos, a criar um grupo exclusivo para regulamentar os lançamentos que incorporam essa tecnologia.

A razão do sucesso das nanopartículas está nas potencialidades que surgem quando uma molécula maior é submetida a sucessivos processos para reduzir seu tamanho. Podem, por exemplo, se tornar mais resistentes ou adquirir a capacidade de conduzir eletricidade. São justamente qualidades como essas que têm sido exploradas por centros de pesquisa e pela indústria farmacêutica. O propósito é criar formas inéditas de levar medicamentos diretamente até as células doentes, além de testes diagnósticos mais sensíveis. Como mísseis teleguiados, programados para detonar apenas quando chegam ao alvo, as nanopartículas são capazes de direcionar os fármacos às regiões atingidas pelas enfermidades, amenizando a intensidade dos efeitos colaterais e o desperdício do medicamento no organismo – dois problemas comuns nas terapias convencionais. Essa precisão torna possível usar doses maiores da droga, reduzindo o tempo de tratamento. É uma revolução que já apresenta resultados concretos no tratamento de doenças como a hepatite C e o tipo de câncer de pele mais comum. Também está trazendo avanços promissores para enfermidades de grande alcance, como a diabetes e o acúmulo de placas de gordura nas veias.

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As versões nanoestruturadas de medicamentos convencionais têm se mostrado eficazes para a terapia de algumas doenças graves. Uma delas é a leishmaniose visceral, mal parasitário que destrói fígado e rins, entre outros danos, e pode ser fatal. Neste caso, a principal vantagem do remédio com nanopartículas é a redução do tempo de internação e dos efeitos colaterais. A droga (Ambisome) está disponível no Brasil, assim como a formulação nano do remédio para o tratamento do sarcoma de Kaposi (tumor maligno do sistema linfático que ocorre em pacientes com Aids), chamado Daunoxome. Há também medicamento nano para hepatice C (Pegasys) e anemia de origem renal (Mircera). “Quem usa os remédios nanoestruturados pode sair da quimioterapia e ir direto para o trabalho, sem sentir enjoos. Eles oferecem realmente menos efeitos colaterais”, diz Ana Luiza Toscano, supervisora da quimioterapia do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo. No caso da hepatite C, a nano facilita a adesão ao tratamento. Enquanto o interferon normal deve ser aplicado a cada dois dias, o produto com nanotecnologia é ministrado uma vez por semana. O empresário Rubens Victor Santos, 55 anos, de São Paulo, usou as duas formas. “A terapia com o nanoestruturado é mais cômoda e as reações foram um pouco mais suaves”, diz.

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SEM CIRURGIA
O câncer de pele de Cid foi curado com uma pomada
nanoestruturada e banhos de luz
 

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Se depender do volume de pesquisas, em breve haverá uma nova safra de remédios nanotecnológicos. Uma das áreas mais beneficiadas será a oncológica. A equipe da pesquisadora Eva Marie Harth, que faz parte de um grupo que engloba cientistas das universidades americanas de Washington, Emory e Vanderbilt, trabalha no desenvolvimento de uma nanoesponja, estrutura de poliéster do tamanho aproximado de um vírus, que recebe em suas paredes algumas substâncias que se ligam apenas às células tumorais. Em testes com animais, foram obtidos resultados de três a cinco vezes mais eficazes do que os tratamentos tradicionais para o câncer. “Com as nanoestruturas, é possível administrar o fármaco apenas onde se encontra o tumor, poupando os demais órgãos e tecidos”, disse Eva Marie à ISTOÉ. De fato, um dos maiores problemas da quimioterapia é que os fármacos capazes de destruir as células tumorais são muito tóxicos para todo o conjunto celular, causando diversos efeitos colaterais.

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PRODUÇÃO
Remédio nano é fabricado em centro
de alta tecnologia na Alemanha

Outras opções para determinar onde a droga irá agir são as terapias fotodinâmicas e o uso de ondas magnéticas. Na primeira, o medicamento só age quando exposto a um tipo de luz. Na segunda, um campo magnético é gerado na área a ser tratada, atraindo as nanopartículas para a região. Foi por meio do tratamento com luz que o engenheiro Agustin Gonzalez Cid, 67 anos, de Barueri (SP), se curou de um câncer de pele do tipo não melanoma, o mais comum dos tumores de pele. “Os médicos passaram um creme na região afetada e, depois de duas horas, aplicaram luz vermelha”, conta.

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Sucesso na cosmética

Foi a partir do uso  em produtos cosméticos que a nanotecnologia ficou mais conhecida. O motivo para a sua vasta aplicação nesse segmento é a eterna batalha dos fabricantes para os produtos chegarem às camadas mais profundas da pele.
“A maioria dos princípios ativos dos cosméticos não atravessa a pele por causa da barreira protetora existente na sua camada superficial”, constata Bartira Bergmann, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Na tentativa de vencer a proteção natural do organismo, a indústria da beleza introduziu em suas formulações as nanoesferas es lipossomas. “Elas são capazes de cruzar a primeira camada da pele e atingir a derme, em que são produzidos o colágeno e a elastina, substâncias que dão firmeza e sustentação. Isso melhora a ação dos produtos”, diz Bartira. Recentemente, a indústria nacional lançou filtros solares nano e estuda linhas anti-idade e acne.

 

PARTE 2
 


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