Em decisão monocrática que será levada ao plenário da Corte, o ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli determinou, acertadamente, que a antiga e demagógica tese de legítima defesa da honra não mais poderá ser utilizada no Tribunal do Júri pelos advogados que defendem aqueles que cometem assassinatos que se enquadrem em feminicídio. Na sua decisão, a partir de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, ajuizada pelo PDT, Toffoli declarou a inconstitucionalidade da tese de legítima defesa da honra – que, nunca é demais repetir, jamais constou formalmente em nossas legislações. Eis um trecho da manifestação do ministro: “Aquele que pratica feminicídio (…), com a justificativa de reprimir um adultério, não está a se defender, mas a atacar uma mulher de forma desproporcional, covarde, criminosa”.

Alexandre de Moraes e Dias Toffoli foram os primeiros no STF a apontarem o caminho civilizatório para punir o assassinato de mulheres

Toffoli fechou, assim, uma perigosa porta que a Primeira Turma do STF deixara aberta: ao julgar, recentemente, um recurso referente a um caso ocorrido em Minas Gerais, essa Turma decidiu pela soberania absoluta da sentença de absolvição dada ao réu pelos sete jurados do Tribunal do Júri, ainda que ela tenha sido concedida de maneira “manifestamente contrária às provas” do processo – o ministro Alexandre de Moraes, com todo acerto e legítima argumentação constitucional, votou contra essa determinação da maioria. Deu seu parecer a favor do recurso do Ministério Público, que pedia novo julgamento, mas foi voto vencido. Eis o caso: um homem tentou matar com uma faca a sua ex-companheira por não aceitar a separação, foi absolvido no Júri e o Parquet recorreu questionando a decisão dos jurados que votaram em choque com a materialidade probatória. A Primeira Turma, à exceção do voto de Alexabdre de Moraes, derrubou o recurso do MP. Agora, o ministro Toffoli deu mais um passo para que os feminicidas não fiquem escudados pela anacrônica tese de legítima defesa da honra, que imperou no Brasil entre os anos 1940 e 1970.

A legítima defesa da honra não pode ser confundida com o princípio geral da amplitude de defesa, amplamente consagrado na legislação brasileira. Mais: Dias Toffoli não está cerceando a liberdade profissional de nenhum advogado, não está dizendo qual o caminho ele pode ou não trilhar na defesa de seu cliente. Não há a menor restrição à livre advocacia, não há sequer um arranhão no “devido processo legal” – até porque, repita-se, a legítima defesa da honra é uma aberração diante do ordenamento jurídico. Alexandre de Moraes e Dias Toffoli apontaram o caminho civilizatório. Jurídica e democraticamente, é o plenário da Corte que tem de dar a palavra final. Até a quarta-feira 10 a votação não fora concluída.