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A ambição faz bem: ela tem sim o lado positivo, que é um dos fatores para alcançar o sucesso. Confira a entrevista com Sulivan França, presidente da Sociedade Latino-Americana de Coaching

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O lado bom de ser ambicioso: Sulivan França, presidente da Sociedade Latino-Americana de Coaching, explica que o conceito negativo de ambição no Brasil é uma questão cultural. Assista ao vídeo

Até não muito tempo atrás, apontar alguém como ambicioso era quase uma ofensa no Brasil. A palavra, carregada de conotação negativa, era praticamente um pecado. A má impressão nasceu da confusão que as pessoas fazem com a ganância – sentimento que faz o indivíduo passar por cima de tudo e de todos. Hoje, porém, a ambição está sendo redimida e seu verdadeiro significado resgatado. A palavra vem do latim ambi dire, que significa entre dois caminhos. Basicamente, escolher para chegar a um objetivo. É um adjetivo positivo, que define as pessoas determinadas. É o combustível daqueles que vão atrás de desejos pessoais e profissionais e querem crescer. Dos que sabem planejar, impor metas e trabalhar por cada uma delas. E o brasileiro está mais afinado com essas ideias do que o senso comum supõe. Uma pesquisa da International Stress Management Association no Brasil (Isma-BR), de 2009, concluiu que 41% da população se define como ambiciosa. Os entrevistados dizem ser motivados, estão satisfeitos com quem são, aprendem com os fracassos e têm planos para diferentes áreas da vida (leia quadro).

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Essa visão mais moderna, que eleva a ambição a uma espécie de força motriz do sucesso, transformou-a também em objeto de curiosidade científica mundo afora. É possível medi-la? Podemos turbiná-la? Ela é apenas um sentimento ou tem explicação biológica? Por si só é capaz de explicar por que alguns são mais bem-sucedidos do que outros? Já há respostas para algumas dessas perguntas. Estudos mostram, por exemplo, que a ambição, essa mistura de energia com determinação, se manifesta no sistema límbico, área do cérebro relacionada às emoções e aos hábitos. Pesquisadores da Universidade de Washington usaram imagens cerebrais para investigar a persistência – a habilidade de focar em uma tarefa até terminar –, considerada a mola propulsora da ambição. Eles recrutaram um grupo de estudantes e deram a cada um questionários elaborados para mensurar o nível de perseverança, com fotos agradáveis e outras desagradáveis, enquanto um aparelho de ressonância magnética registrava o que se passava na cabeça dos alunos. Em geral, os estudantes com as maiores pontuações (os mais persistentes), apresentaram maior atividade na região límbica.

Não há consenso entre os especialistas sobre em que medida a ambição está dentro de todos. Para uns, a educação é a maior influência. Para outros, é um sentimento inerente ao ser humano e depende apenas de autoconhecimento para vir à tona. No meio da dúvida, a única certeza é que quem opta por ficar numa zona de conforto, sem enfrentar desafios, acaba jogado de um lado para o outro, sem tomar as rédeas da própria vida. As circunstâncias acabam por definir o futuro. E aí é mais cômodo culpar o destino, a sorte ou terceiros pelas mazelas.

“Quem pensa assim desconsidera que os vencedores estudaram muito, foram atrás, deram a cara para bater”, diz a psicóloga Maria de Lurdes Damião, mestre em gestão de pessoas e autora do livro “Competência – A Essência da Liderança Pessoal” (Ed. Saraiva), lançado em novembro passado. O ambicioso incomoda, antes de mais nada, os acomodados, que, em vez de se mexer, preferem criticar.

Estabelecer metas

E como despertar a ambição? “Com metas e autoconhecimento”, diz a psicóloga Ana Maria Rossi, presidente do (Isma-BR). Vale lançar mão de todas as alternativas disponíveis: orientação profissional, cursos específicos para melhorar a autoestima, terapias e a compreensão de que a vida se constrói aos poucos, constantemente, com dedicação e ética. Junto com o desempenho profissional, as metas pessoais são igualmente importantes. Projetos a dois, constituir família, viagens, tudo deve ser planejado em equilíbrio com a carreira, para depois não olhar para trás e perceber que coisas essenciais se perderam no caminho. O coach Sulivan França, presidente da Sociedade Latino-Americana de Coaching, ressalta que não é só empresa que precisa de planejamento estratégico. O ser humano também. Só não adianta, num mundo globalizado, de mudanças constantes e cada vez mais rápidas, estabelecer prazos longos demais. “Seis meses é suficiente, no máximo um ano”, diz ele. “É o tempo de conquistar, avaliar, rever alguns pontos sem o risco de patinar na própria projeção.”

Objetivos claros

Essa capacidade de se colocar metas e saber avaliá-las permitiu à empresária Amália Sina, 46 anos, conquistas até antes do que ela previa. “Eu sempre quis ser alguém, fazer a diferença”, diz Amália, que fundou há quatro anos a Sina Cosméticos, depois de ocupar altos cargos em empresas, como a vice-presidência para a América Latina da Philips. Cedo, Amália soube que precisava de objetivos claros para seguir adiante. Órfã de pai e mãe desde os 9 anos, assumiu os cuidados com a casa enquanto os irmãos mais velhos trabalhavam fora. Aos 19, teve o primeiro emprego. Logo criou um lema para si mesma: ser gerente antes dos 30, diretora antes dos 40 e presidente antes dos 50. Aos 40 anos, já estava na presidência da Walita do Brasil. Diz que os pilares de seu sucesso foram a capacidade de análise, o poder de comunicação, não defender pontos de vista óbvios e a honestidade. “Quem é mau-caráter não vai longe porque não demora a ter as pernas quebradas”, acredita.

A trajetória de Amália reflete claramente como a ambição, quando bem usada, tem poder para conduzir a pessoa ao sucesso. Ela desafiou um mundo tipicamente masculino e venceu. Neste quesito, o gênero é relevante? Pesquisas indicam que a ambição feminina difere da masculina. Um estudo conjunto das universidades americanas de Pittsburgh e Stanford, em que 40 homens e 40 mulheres participavam de jogos e cada acerto valia US$ 0,50, provou isso. Eles têm apetite por competição, querem ganhar o quanto antes. Elas avaliam mais e são seletivas sobre quando se engajar num desafio. Estão dispostas a ir em frente mesmo que exista uma alta exigência, mas não se sujeitam a tudo e a qualquer preço. A explicação estaria na evolução da humanidade, que fez os homens mais rápidos e dispostos a avançar sempre, garantindo a reprodução da espécie, e deu às mulheres o dom de se preocupar com a segurança dos demais dentro de um mundo hostil.

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O corpo é um poderoso espelho, que consegue refletir com exatidão uma pessoa ambiciosa. O olhar é concentrado. A postura é confiante. A imagem é produzida, em especial no ambiente de trabalho. Mas sem excessos, sem tentar chamar a atenção de maneira equivocada (que não seja pela capacidade) e cair nas armadilhas inconscientes que comprometem a ascensão.“O ambicioso tem claro para si os pontos que o colocarão em evidência ao se expressar, além de saber fazer uma leitura do que o cerca”, afirma a cientista social Isabel Macarenco, também autora do livro “Competência”. Por isso, a pessoa investe, ainda, na maneira de se comunicar. Demonstra interesse em aprender, é observador, criativo, flexível, realista, focado, argumenta com educação (e firmeza) e evita as fofocas de corredor, além de apresentar um trabalho acima das expectativas.

Acreditar no potencial

Essas habilidades levaram o engenheiro mecânico Antonio Marcelo de Almeida, 36 anos, a derrubar os obstáculos inerentes à vida de quem veio de uma família simples. Nascido em Conceição das Pedras, cidade mineira de três mil habitantes, Almeida trabalhava na roça e como ajudante de pedreiro de dia para estudar à noite, incentivado pelos pais. “Apesar de semianalfabetos, eles exigiram que eu e meus irmãos estudássemos para ter futuro”, lembra. “Pelas condições adversas, poucos acreditavam que eu conseguiria.” Ele ingressou em uma universidade federal e se manteve como monitor e com uma bolsa de estudos. Formado com louvor, foi contratado por uma empresa de petróleo francesa, pela qual trabalhou na Nigéria, em Angola e na Escócia. Está há 12 anos na Novelis, empresa de alumínio, como gerente de produção. Ambição, em sua opinião, é galgar postos com um serviço benfeito (para as oportunidades aparecerem naturalmente) e não ter medo de dar o próximo passo, ainda que ele pareça grande demais. “Nem sempre é necessário estar 100% preparado para assumir um cargo. Basta acreditar em seu potencial”, diz.

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A nova geração deve enterrar de vez as dúvidas que porventura ainda restem sobre os benefícios de ser ambicioso e apagar a autoimagem derrotista cultivada pelos brasileiros ao longo de sua história. “A nossa dificuldade com a ambição vem da cabeça de colonizado. Portugal era um país jovem e também não tinha autoestima. Fomos colonizados por uma nação sem confiança”, diz a psicóloga Maria de Lurdes.
O sentimento persistiu por um longo período, reforçado por uma educação baseada na religião católica, que via na ambição não uma qualidade, mas apenas uma vaidade individualista. Uma pesquisa recém-concluída do Portal Educacional do Grupo Positivo de Ensino dá uma medida do que pensam os estudantes brasileiros hoje. Dos 1.406 jovens de 11 a 16 anos ouvidos em 18 Estados, 95% acreditam que vencer na vida é fundamental. Isso é bom, dizem os especialistas, desde que ensinado de maneira equilibrada, sem pressões, com base na ética. A pesquisa indicou ainda que, 90% dos jovens coloca, em ordem de importância, vencer na vida na frente dos pais, de sentir-se bem consigo mesmo e dos amigos.

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O empresário Pedro Furlan, 30 anos, considerava o Lego (para construir) e o Banco Imobiliário (para ganhar dinheiro) seus brinquedos preferidos quando garoto. Um dos herdeiros da Sadia, ele sempre foi incentivado pelos pais e tios a chegar longe. Trabalhou na indústria da família e poderia ter se acomodado na segurança do império do setor de alimentos iniciado por seu bisavô e pelo qual passaram seu avô e seu pai, o ex-ministro do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan. Mas resolveu se arriscar e trilhou um caminho próprio.

DNA de empresário

Há quatro anos, ele fundou a Nativ, uma empresa de pescados, setor pouco explorado no País. A previsão de faturamento da companhia para 2010 é de R$ 36 milhões. “Sempre desejei ser dono de algo criado por mim e que também fosse inovador”, afirma. O DNA é mesmo de empresário: “Na faculdade de administração de empresas, enquanto os demais alunos queriam entender o direito do trabalhador, eu buscava compreender os direitos e deveres do patrão”, afirma.

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Pedro veio de uma família rica, que apoiou seu perfil empreendedor. No entanto, é na classe média que surge a maior parte dos ambiciosos, dizem os especialistas. Afinal, é o grupo que tem alguma segurança econômica, mas não o suficiente para se acomodar. Autoestima é outra condição essencial para querer ir longe. Uma pesquisa da Associação de Psicologia Americana indicou que pessoas com este sentimento elevado são mais tenazes ao cumprir tarefas – o que as faz ambicionar cada vez mais. A confiança em si mesmo é tão importante que foi o único caminho encontrado pelo administrador e estudante de economia Frederico Lanzoni, 25 anos, para crescer. Aluno exemplar, ele sofreu cobranças da família e dos amigos por não ter sido efetivado rapidamente no emprego ao se formar na primeira faculdade. “Minha autoconfiança despencou e nada do que eu tentava dava certo”, lembra o jovem, que se arriscou em processos seletivos, uma viagem à Europa, a abertura de um negócio próprio – tudo sem sucesso. Terapia e um curso de liderança pessoal ajudaram Frederico a dar um novo rumo aos sonhos. Hoje, contratado como analista em um banco de investimentos, planeja ainda abrir uma empresa de material esportivo com dois amigos. “Pessoas com autoestima não têm sorte, elas tentam até conseguir”, diz ele. “Aprendi que obstáculo não é barreira, é oportunidade.”

Batalha diária

Ambição não é uma característica importante apenas para a vida profissional. Afinal, investir também no lado pessoal é o que garante a felicidade – e não apenas o sucesso. Ainda menina, a estilista Maria Zeli, 61 anos, descobriu a importância do dinheiro. Aos 10 anos, cobrava das irmãs para arrumar suas unhas e cabelos.

Com o que ganhava, comprava tecido e mandava fazer vestidos na costureira. Por sua conta, bordava flores, pérolas. Vinda do interior de São Paulo, chegou à capital paulista para trabalhar como professora e estudar pedagogia. As colegas se encantavam com suas roupas e ela logo transformou seu talento em negócio. Comprou diferentes peças e vendeu tudo às amigas no mesmo dia. Reinvestiu o dinheiro em mais roupas. Até que, em 1975, abriu sua primeira butique na edícula dos fundos de casa. Hoje, a maison que leva seu nome fica em Moema, bairro nobre, e começa a formatar um plano de franquias. Seus vestidos de festa e de noivas custam, em média, R$ 1 mil. Maria Zeli é bem-sucedida profissionalmente, mas elege as filhas como sua maior conquista. “Adoro ser mãe”, afirma, referindo-se a Patrícia, 37 anos, a Vanessa, 36, e a Nicole, 16. A mais velha é também dona de uma loja. A do meio trabalha junto com Maria Zeli. A caçula se prepara para estudar moda. Nicole nasceu quando a estilista já estava com 45 anos e com a carreira estabilizada. “Queria muito ser mãe novamente. Tive três abortos naturais antes”, conta ela que não se sentiria realizada se não tivesse conseguido concretizar sua ambição pessoal. “Fui perseverante em tudo. A sorte também veio, mas como merecimento pela honestidade e pela batalha diária”, acredita.

Efeitos negativos

É preciso estar atento para que a energia e a determinação tão caras às pessoas que têm ambição não cobrem uma fatura elevada demais ao longo do tempo. Segundo a pesquisa da Isma-BR, 56% dos ambiciosos vivem sobrecarregados e 58% sofrem com autocobrança, fáceis gatilhos para crises de stress e ansiedade. E quem convive com isso está sujeito a desenvolver doenças cardiovasculares, problemas gastrointestinais e até transtornos mentais, como fobias e depressão. A solução é ambicionar, também, uma saúde de ferro, com alimentação equilibrada, atividade física, momentos de lazer. Sabendo usar as ferramentas corretas, sem medo de evoluir, com disposição para assumir responsabilidades, as conquistas chegam.

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