Depois de meses de expectativa, a manhã seguinte à aprovação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados foi menos eufórica do que se esperava. Na segunda-feira 18, a Bolsa de Valores abriu em baixa, enquanto o dólar subia após uma intervenção do Banco Central. No fim do dia, o recuo das ações foi de 0,63% e a moeda americana passou a valer R$ 3,59. A influência negativa veio de fatores externos e do fato de os investidores já terem antecipado o resultado que se viu no domingo 17. Ainda assim, um vento de recuperação da confiança dos agentes econômicos começou a soprar.

Segundo uma pesquisa do Lide, realizada na segunda 18 em parceria com a Fundação Getúlio Vargas, os empresários estão mais otimistas. Para a grande maioria deles, o cenário político ainda é o fator que mais prejudica o crescimento de suas empresas, mas a disposição de contratar funcionários aumentou junto com a previsão de receita para 2016. Ou seja, o clima empresarial melhorou. Apesar disso, o índice que mede essa percepção é menor que a metade do índice observado em 2010, quando atingiu o pico, o que demonstra certa cautela com o processo político, que ainda deve passar pelo Senado antes do afastamento da presidente. Na sondagem, foram entrevistados 404 presidentes, executivos e outros líderes empresariais em São Paulo.

“Existe um otimismo, mas um grande temor ainda porque o impeachment não está concreto”, diz Ronald Masijah, presidente do Sindivestuário e diretor-presidente da fabricante de lingeries Darling. “Seja quem for o novo presidente, há uma lufada de esperança. Ao fim de todo esse processo, espero que o consumidor comece a se preocupar menos em perder o emprego, volte a gastar e as fábricas retomem a produção e recontratem os demitidos.” Nos últimos anos, a indústria perdeu participação no Produto Interno Bruto e promoveu demissões em massa. Só o setor de vestuário empregava cerca de 2 milhões de pessoas há dez anos e hoje emprega meio milhão a menos – nos últimos 12 meses, 110 mil trabalhadores foram para a rua. Para Masijah, uma retomada gradativa poderá ser vista a partir do segundo semestre.

Menos do que nos fundamentos, a base dessa onda de otimismo está nas expectativas – sobretudo, na de que um novo presidente seja capaz de restaurar a confiança de empresários, consumidores e investidores. “A bolsa acumula alta de 23% no ano e isso decorre essencialmente da percepção do mercado de que o impeachment tem grande possibilidade de acontecer”, diz Pedro Paulo Silveira, economista-chefe da Nova Futura Corretora. Na terça-feira 19, a Bolsa corrigiu a trajetória e fechou em alta de 1,54%, um movimento que deve continuar nas próximas semanas. Em até três meses, o Ibovespa, hoje em 53 mil pontos, deve chegar aos 60 mil pontos.

O primeiro passo para a retomada da confiança está no Congresso. A construção de uma grande coalizão ao redor de Michel Temer, espera o mercado, poderá destravar pautas como a simplificação do sistema tributário, a reforma previdenciária e a flexibilização de leis trabalhistas. Na semana passada, a continuidade do processo de impedimento levou a uma mudança nos fundos de ações e gestores de recursos voltaram a investir em empresas com forte participação no mercado doméstico. A expectativa é que, sem Dilma no Palácio do Planalto, o governo se empenhe na concessão de estradas, portos e aeroportos, impulsionando o setor de infraestrutura, e as estatais passem por uma mudança de gestão.

Nesse ponto, o anúncio da nova equipe econômica de um eventual governo Temer é questão-chave. “O mercado, sem dúvida nenhuma, espera uma política econômica mais ortodoxa, traduzida por dois pontos principais: controle de inflação e saneamento das contas públicas”, diz Fernando Bergallo, diretor da FB Capital. Do lado do ajuste, é consenso entre os economistas que os cortes nas despesas deverão ser substanciais. O aumento de impostos cogitado pelo virtual futuro ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, num momento de grave recessão, poderia adiar ainda mais o crescimento e prejudicar a aprovação de Temer entre o empresariado e a classe média. “Há que se frear essa sangria com relação aos gastos e dirigir esforços para o ano que vem”, diz Manuel Enriquez Garcia, presidente da Ordem dos Economistas do Brasil. “Já que 2016 está fortemente comprometido do ponto de vista fiscal, que sejam colocadas as bases para 2017 e 2018.”

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