28/08/2015 - 19:30
A segunda-feira 24 começou como um pesadelo para os investidores que acompanhavam o desempenho da bolsa de valores de Xangai, a principal da China. Desde junho, as perdas do mercado de ações chinês chegam a 38%. Naquele dia, não foi diferente. A bolsa caiu 8,5%, no pior resultado em oito anos, e o nervosismo se espalhou entre os investidores da Ásia aos outros continentes. Nos Estados Unidos, as quedas em Wall Street ultrapassaram os 3%, assim como no Brasil. As bolsas europeias não tinham um dia tão difícil desde o início da crise financeira, em novembro de 2008. O mesmo aconteceu com os preços de matérias-primas negociadas no mercado internacional, como o petróleo e o minério de ferro. Diante dos tropeços, cada vez mais frequentes, do mercado acionário chinês, economistas do mundo inteiro têm se questionado se esses percalços não são um sinal de que a desaceleração da segunda maior economia global tem sido mais intensa do que o esperado. E esse seria um pesadelo ainda maior, considerando que, só no ano passado, Pequim respondeu por quase 40% do crescimento global.
SEGUNDA NEGRA
Investidores se desesperam com queda de 8,5% nas ações da bolsa de Xangai
O discurso oficial é de que o país tem avançado a uma taxa anual de 7%, menos do que os 7,4% de 2014, mas ainda assim muito acima dos 2,5% previstos para a economia americana em 2015 e a retração de 1,5% para o Brasil, segundo o Fundo Monetário Internacional. Na prática, porém, o governo chinês tem feito intervenções que mostram que a saúde da economia pode não estar tão boa. Primeiro veio a desvalorização da moeda. Na semana passada, o banco central reduziu as taxas de juros pela quinta vez desde novembro e aumentou a quantidade de dinheiro disponível para o crédito, na expectativa de que isso estimularia o crescimento num momento sombrio, em que as exportações começaram a recuar. Para completar, o nível de endividamento disparou e agora corresponde a 250% do Produto Interno Bruto. “Por um tempo, Pequim não será mais capaz de investir no mercado imobiliário e na infraestrutura, como fez no passado”, disse à ISTOÉ Dwight Perkins, professor de Política Econômica e estudioso de China na Universidade de Harvard. “O mundo vai ter que se acostumar com uma China mais focada nos serviços e no consumo.” Nesses setores, porém, também há preocupação. No segundo trimestre, as vendas de smartphones caíram pela primeira vez em seis anos.
Muitos chineses não compartilham do pessimismo. Um editorial da agência de notícias estatal Xinhua classificou a ansiedade em torno da China como “desnecessária”. “Apesar do fraco desempenho da indústria e do mercado imobiliário, o rápido crescimento do setor de serviços tem se tornado o novo destaque da economia chinesa”, diz. “Exagerar os problemas pode trazer mais incertezas à economia mundial, perturbar os mercados financeiros e, eventualmente, diminuir o ritmo de recuperação para todos os países.” Para Gilmar Masiero, coordenador do Programa de Estudos Asiáticos da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, as avaliações de que o governo teria perdido o controle da economia são infundadas. “São três décadas e meia de progresso acelerado”, afirma. “A China é uma economia socialista de mercado, na qual o Estado é o principal investidor e não vai deixar seus bancos quebrarem.” Enquanto os agentes econômicos não se acalmam, começam a surgir as primeiras notícias do impacto político da crise que se aproxima. Responsável pelo plano que tentou impulsionar o mercado de ações em julho, com forte intervenção do governo, o primeiro-ministro, Li Keqiang, tenta se equilibrar no cargo. Para os analistas políticos, se essa crise tiver um rosto será o do atrapalhado Keqiang.
Foto: AP Photo/Joshua Paul