Filho de queniano, Barack Obama fez na semana passada sua terceira e provavelmente última viagem pelo continente africano enquanto presidente dos Estados Unidos. Se, em 2009, ele prometeu uma virada (nunca cumprida) nas relações entre EUA e África, e, em 2013, levou um pacote para o setor elétrico, desta vez Obama se dedicou às críticas. Num discurso histórico na sede da União Africana em Adis Abeba, capital da Etiópia, o democrata reconheceu os recentes avanços econômicos dos países do continente, mas enfatizou que eles poderiam ser maiores se não fosse pelo “câncer da corrupção”. “Isso não é algo único da África. A corrupção existe no mundo todo, inclusive nos EUA”, disse. “Mas aqui a corrupção suga bilhões de dólares de economias que não podem se dar ao luxo de perder bilhões de dólares que poderiam ser usados para criar empregos, construir hospitais e escolas.” Obama saiu do local ovacionado.

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PROVOCADOR
Obama questionou líderes do continente em discurso
na sede da União Africana, na Etiópia

As provocações do presidente americano tiveram alvo certo em alguns momentos, como quando declarou: “O progresso democrático da África também está em risco quando líderes se recusam a se afastar quando seus mandatos acabam.” Há duas semanas, o presidente do Burundi, Pierre Nkurunziza, conquistou seu terceiro mandato no primeiro turno de eleições contestadas por observadores internacionais. Considerada anticonstitucional, sua candidatura provocou uma série de manifestações duramente reprimidas pelo governo. O mesmo senso crítico faltou quando Obama se referiu ao primeiro-ministro da Etiópia, Hailemariam Desalegn, como democraticamente eleito. Em maio, sua coalizão, que está no poder desde 1991, recebeu 100% dos votos.

Nos cinco dias que passou entre o Quênia e a Etiópia, Obama colocou na agenda a defesa dos direitos humanos. Citando as filhas, Sasha e Malia, o americano reafirmou que as garotas têm que ser tratadas com igualdade e que as tradições nem sempre são boas. Obama disse isso porque, em diversos países africanos, as mulheres passam por mutilação genital, são forçadas a se casar ainda crianças e são impedidas de frequentar a escola. A mensagem talvez não tivesse a mesma força se tivesse sido transmitida por algum de seus antecessores. Obama tem o mérito, afinal, de ser visto como um deles.

Foto: AFP PHOTO / SAUL LOEB