Interessadas no perdão administrativo do governo para continuar firmando contratos com o poder público, empresas que negociam acordos de leniência com a Controladoria-Geral da União (CGU) já ofereceram preciosas informações sobre o esquema de desvio de verbas em obras fora do País envolvendo empreiteiras investigadas pela Operação Lava Jato. Segundo relatos de executivos da UTC e da Engevix à CGU, integrariam o braço internacional do Petrolão um empreendimento da Queiroz Galvão em parceria com a Eletrobrás na Nicarágua – a hidrelétrica de Tumarín, que começou a sair do papel este ano – e o projeto da usina de Inambari, no Peru, de responsabilidade da OAS. Seguindo modo de operação já identificado pela Lava Jato, as duas obras teriam sido negociadas com superfaturamento de preços a fim de garantir margem suficiente para o pagamento de propina a políticos.

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TOMA LÁ, DA CÁ
Usina no Peru que receberá aporte de U$S 4 bilhões teria sido superfaturada

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A hidrelétrica da Nicarágua foi orçada inicialmente em U$S 800 milhões e já custa U$S 1,1 bilhão. O BNDES entrou com U$S 342 milhões do total da obra. A negociação entre o governo nicaraguense e a Queiroz Galvão se estendeu por dois anos. Os representantes do poder público não concordavam com os termos apresentados pela empreiteira. O conflito só teria sido foi resolvido, de acordo com informações prestadas por representantes da UTC e Engevix, graças à intervenção direta da presidente Dilma Rousseff, em março de 2014. A participação do governo brasileiro na solução da questão ocorreu – segundo relato dos mesmos emissários das empresas que buscam o acordo de leniência – após a empreiteira ter se comprometido a fazer uma doação de campanha ao PT. O diretório da legenda e a campanha de Dilma receberam R$ 6,5 milhões da Queiroz Galvão em 2014.

As irregularidades em consórcios do setor elétrico formados por empreiteiras do clube da Lava Jato e estatais brasileiras no exterior são, por enquanto, a única contribuição às investigações que a delação no âmbito empresarial produziu. No acordo de leniência, as empresas pleiteiam perdão administrativo e não têm motivos para produzir novas provas contra si. A confissão de crimes ainda não detectados pode ser administrativamente perdoada pela CGU, mas outras instâncias têm poder de investigar as irregularidades relatadas no âmbito da leniência. Por isso, na maior parte dos casos, as empresas têm informado superfaturamento em obras já pagas ou concluídas, situações que do ponto de vista de preservação dos cofres públicos acrescenta muito pouco. Informações sobre investimentos internacionais com vícios do esquema de corrupção, porém, podem livrar as empreiteiras de investigações internas e agradaram à equipe responsável pelos acordos. Os empreendimentos energéticos ainda estão em fase inicial e podem ajudar o País a poupar milhares de reais que abasteceriam outra modalidade do Petrolão.

A Engevix tenta costurar um acordo com a CGU desde março. Na semana passada, foi a vez da UTC propor à controladoria adesão aos termos da leniência. Ambas participaram de consórcios de empreendimentos no Peru e têm informações sobre os bastidores das negociações que envolvem a construção da hidrelétrica de Inambari e de Tumarín, na Nicarágua. O projeto da OAS se arrastava por causa de questões ambientais peruanas, mas no ano passado o governo assumiu as conversas para destravar o empreendimento que receberá investimentos de U$S 4 bilhões.

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O setor jurídico da Eletrobrás está preocupado com o avanço das investigações no ramo de energia. Como a estatal está presa às empreiteiras investigadas pela Lava Jato por cláusulas contratuais, advogados buscam elementos para enquadrar o comportamento das empresas em ações que configurem quebra de ética empresarial para revisar consórcios já formados em outros países. Apesar de a estatal do setor elétrico estar se protegendo para evitar continuar projetos com empreiteiras envolvidas na Lava Jato, a direção da Eletrobrás foi diretamente citada nas investigações da Polícia Federal. O depoimento de delação premiada do dono da UTC, Ricardo Pessoa, colocou o diretor da Eletrobrás, Valter Cardeal, no centro das investigações. Pessoa afirmou que ele cobrava doações de campanha em troca de acertos contratuais.

A oposição tentou, na última semana, convocar Cardeal para prestar esclarecimentos na Comissão de Minas e Energia, mas a base do governo conseguiu evitar o comparecimento do diretor da Eletrobrás. Em março, quando ainda estava na base de apoio do governo, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), atendeu pedido do Planalto e barrou a instalação da CPI do Setor Elétrico. Agora, oficialmente rompido com o Planalto, Cunha sinaliza que pode apoiar a criação da CPI. A julgar pelas informações repassadas pelos diretores da UTC e Engevix a autoridades da CGU, a investigação promete ser mais um motivo de preocupação para o governo da presidente Dilma Rousseff. 


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