"Se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação e vã a nossa fé”, diz a primeira carta de Paulo aos Coríntios na Bíblia. A mensagem é inequívoca. O retorno do mundo dos mortos do filho de Deus e sua ascensão aos céus são pilares do cristianismo. A descoberta do corpo do Messias, assim, abalaria a própria crença na religião. Ao anunciar que possui novas evidências comprovando a autenticidade dos restos mortais de Jesus, portanto, um cientista baseado em Jerusalém põe em xeque a convicção de dois bilhões de cristãos. “A descoberta confirma a existência de Jesus de Nazaré, além de amparar as afirmações de que ele foi casado e que teve um filho chamado Judas”, disse à ISTOÉ Aryeh Shimron, que conduziu o estudo e é pesquisador aposentado do Geological Survey of Israel, instituto público do país especializado em Ciências da Terra.

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POLÊMICA
Além de contestar um dos pilares do cristianismo, o estudo
afirma que Jesus foi casado e teve um filho

A nova pesquisa está relacionada a dois polêmicos achados anteriores. Em 2002, um colecionador divulgou possuir um ossuário com o escrito “Tiago, filho de José, irmão de Jesus”. Em 2007, um documentário revelou que dez urnas funerárias encontradas em 1980 no bairro de Talpiot, em Jerusalém, levariam inscrições como “Jesus, filho de José”, “Maria Madalena” e “Judas, filho de Jesus”. Ali estariam os restos mortais do Messias, sua mulher e seu filho. Em abril deste ano, Shimron realizou uma análise comparando as duas descobertas. Mensurando elementos como alumínio, magnésio e potássio, chegou à conclusão de que elas possuíam assinaturas químicas idênticas. São, portanto, derivadas do mesmo local. A convergência de tantos nomes bíblicos ligados ao filho de Deus num único lugar, de acordo com o geólogo, fortalece a chance de serem relacionados a Cristo. “Se descobríssemos uma tumba em Liverpool com quatro ossuários com os nomes de George, John, Ringo e Paul, concluiríamos de que se trata da sepultura dos Beatles. A evidência de que essa é a Sagrada Família é muito forte, quase inequívoca”, afirma Shimron.

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Para os críticos, os achados originais não são conclusivos. O Ossuário de Tiago é considerado falso pela Autoridade de Antiguidades de Israel, apesar de um julgamento de 2012 ter decidido que não há elementos que refutem sua veracidade – e nem que a atestem. Já na urna onde está escrito em aramaico “Jesus, filho de José”, do conjunto de Talpiot, por exemplo, o nome de Cristo é apenas uma de quatro possibilidades. “Ainda que fosse o nome de Jesus, já foram catalogados 917 ossuários escavados em Jerusalém. Destes, 25% trazem inscrições, dez delas com ‘Jesus’. Como se pode ver, era um nome comum”, diz o arqueólogo Rodrigo Silva, professor do Centro Universitário Adventista de São Paulo. Especialistas afirmam ainda que a assinatura química poderia ser a mesma para outras sepulturas da região. Também questionam o fato de que a pesquisa não foi publicada em um periódico científico (o que Shimron diz pretender fazer).

Se comprovada a autenticidade do trabalho, o Presidente da Associação Brasileira de Arqueologia do Mediterrâneo Oriental, Jorge Fabbro, considera que “para a vertente do cristianismo que vê a ressurreição como literal seria catastrófico. Mas para quem crê em ressurreição espiritual ou como metáfora para a recuperação da fé, não.” A visão do próprio Shimron é positiva: “Vai reforçar o credo das pessoas ao invés de ameaçá-lo. Talvez o modifique.”

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Fotos: Shanks’ Biblical Archaeology Review/AP Photo; Aryeh Shimron  


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