Uma generalizada desesperança com o momento atual e com os rumos do Brasil sob o comando da presidente Dilma Rousseff. Talvez seja essa a melhor síntese do que se observou durante o 14º Fórum de Comandatuba no último final de semana. Promovido pelo Lide – Grupo de Líderes Empresariais – o encontro reuniu cerca de 700 pessoas, entre eles empresários representantes de significativa parcela do PIB brasileiro, deputados, senadores, governadores e ex-presidentes que debateram medidas para combater a crise institucional e política no Brasil. O desalento com a atual política começou a ficar latente já no domingo 19, durante debate que reuniu no mesmo palco quatro ex-presidentes: Fernando Henrique Cardoso (Brasil), Jorge Quiroga (Bolívia), Luis Alberto Lacalle (Uruguai) e Vicente Fox (México).

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NOSTALGIA LATINA
Da esquerda para a direita, os ex-presidentes Jorge Quiroga (Bolívia), Vicente
Fox (México), Fernando Henrique Cardoso (Brasil) e Luis Alberto
Lacalle (Uruguai) lamentam o encolhimento brasileiro

“O Brasil nos últimos anos foi ficando isolado do ponto de vista do relacionamento comercial. O México tem mais de 30 acordos desse tipo. O Brasil tem três. A nossa liderança (presidente Dilma Rousseff) perdeu a capacidade de escolher. Foi encolhendo a posição do Brasil nesse contexto internacional. E hoje na América Latina nós temos nitidamente toda a Costa do Pacífico com uma posição muito mais aberta do que nós aqui, que ficamos submetidos àquela idéia antiga de que vamos nos defender. À lá Venezuela, à la Argentina”, disse Fernando Henrique, numa crítica direta às opções ideológicas impostas pelo PT à política externa do Brasil. O debate com os quatro ex-presidentes pode ser considerado um dos melhores momentos de todos os encontros já promovidos pelo Fórum Comandatuba. E, diante de uma platéia ávida por sugestões que possam tirar o País do atoleiro em que se encontra, a presença dos antigos chefes de estado fez com que por algumas horas se vivesse um clima de nostalgia latino-americana na Bahia, exatamente no momento em que as crises econômica e política voltam a se instalar nos principais países do continente.

A maior reclamação entre os empresários presentes foi a ausência de um diálogo franco entre o governo e o setor produtivo. A constatação foi feita pelo presidente do Lide, João Dória Júnior. “O debate, a diversidade de opiniões, a busca de soluções e uma agenda positiva podem contribuir para encontrarmos saídas para as dificuldades que o País atravessa”, disse Dória. Membro do Conselho Administrativo da Brasil Foods, Luiz Fernando Furlan também registrou a falta de diálogo e ressaltou: “A melhor solução seria que o governo funcionasse, para que as coisas voltassem o mais próximo possível da normalidade. E que o setor produtivo tivesse uma previsibilidade tanto política quanto econômica, porque é isso que faz a empresa investir, criar empregos e olhar positivamente para o futuro.”

A ausência de líderes do governo e de parlamentares petistas no evento reforçou a idéia de desesperança com o momento atual. “O isolamento da presidente Dilma originou um novo ciclo de articulação política e a crise pode se agravar caso o pacote de ajuste fiscal seja desvirtuado pelo Congresso”, disse o cientista político Gaudêncio Torquato. Segundo ele, todos os setores da indústria demitiram e o conjunto das crises hídrica e energética pode gerar animosidade social. “Como ocorre há mais de dez anos, esse evento é uma grande oportunidade para o governo buscar um entendimento com o empresariado, mas parece que isso não está na atual agenda da presidente Dilma”, disse um dos empresários presentes. Na abertura do encontro, Dória lamentou com veemência a ausência das autoridades petistas. “Convidei 13 senadores e 15 deputados, mas o PT fugiu do debate”, disparou o anfitrião.

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Na prática, o governo acabou representado pelo peemedebista recém-nomeado ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves. De forma tímida, ele não conseguiu se colocar como alternativa de diálogo e se limitou a ser um contraponto àqueles que não descartam um processo de impeachment contra a presidente caso seja comprovada sua participação em crime de responsabilidade. “Não podemos ter o terceiro turno das eleições”, disse o ministro, em resposta ao senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), que evocou ferozmente a tese de impedimento. O ministro do Tribunal de Contas da União Augusto Nardes tratou de colocar um pouco de combustível no debate. Afirmou que a presidente poderá, sim, ser responsabilizada: “Existem várias situações de ilegalidade em relação às pedaladas fiscais. No ano passado havíamos encontrado uma situação muito crítica pelo fato de o Ministério da Fazenda não ter contabilizado algumas operações. E agora constatamos que houve uma série de empréstimos feitos pela Caixa Econômica Federal sem uma sustentação legal”. Ao todo, o rombo aventado por Nardes pode chegar a R$ 2,3 trilhões.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), hoje um dos principais protagonistas da política brasileira, também admitiu o isolamento da presidente Dilma e afirmou que somente uma reforma política será capaz de reunificar o País. “Na última eleição houve uma vitória eleitoral, mas ela não trouxe uma hegemonia política. Falta explicar qual a agenda do País para termos menos contestação da sociedade”, disse o deputado. Considerado o maior encontro empresarial do Brasil, o evento no ensolarado final de semana na Bahia teria sido uma boa oportunidade para a presidente e sua equipe exporem uma agenda convergente.

Fotos: Gustavo Rampini 


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