Na quinta-feira 16, a prefeitura de São Paulo declarou uma tardia guerra à dengue. O prefeito Fernando Haddad anunciou que pediu auxílio ao Exército para ajudar a conter a proliferação do Aedes Aegytpi, o mosquito transmissor do vírus causador da doença. Já são mais de oito mil os casos da enfermidade na cidade neste ano. Em 2015, no mesmo período, foram cerca de três mil.

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EMERGÊNCIA
Em São Paulo foram montadas tendas de
atendimento nos bairros mais atingidos

A medida anunciada por Haddad diz muito sobre como o Brasil e seus governos – federal, estaduais e municipais – vêm tratando a dengue desde a primeira epidemia, registrada em 1986 no Rio de Janeiro e em algumas capitais nordestinas: colocar tranca em uma porta arrombada. É inadmissível que, em 2015, as maiores cidades do País ainda sofram com tendas improvisadas, hospitais sem condições de atendimento e carência de agentes de saúde. Tudo isso só ocorre porque há descaso do poder público.

Em São Paulo, a tentativa de conter a doença implicará receber cinquenta soldados, que serão destacados para acompanhar 2,5 mil agentes de saúde nas visitas às regiões onde a população resiste à entrada dos funcionários em suas residências. Antes, a administração municipal também espalhou pelos bairros mais atingidos tendas para o atendimento dos doentes porque hospitais e unidades de saúde não estão dando conta da assistência a tantas pessoas. E, é claro, houve dificuldades de atendimento também nesses locais improvisados.

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Ações emergenciais estão sendo tomadas em todo o estado de São Paulo, o segundo com mais casos – 585 por 100 mil habitantes –, podem ser vistas em Goiás, que registra até agora 702 casos por 100 mil habitantes, e em vários outros pontos do país castigados pelo vírus. Em São Paulo, por exemplo, o governo estadual mobilizou trinta médicos militares para integrar uma força-tarefa contra a doença. Neste ano, a força de propagação do vírus impressiona. De janeiro a março, o Ministério da Saúde registrou 460,5 mil casos, totalizando um aumento de 240% em relação ao mesmo período do ano passado. E não se sabe se o pior ainda está por vir, em especial na região Sudeste, onde as chuvas demoraram mais a chegar e podem se estender por mais algumas semanas.

O grande problema é que a situação vista hoje foi possível de ser vislumbrada, tomando como base o triste histórico brasileiro de epidemias da doença. Portanto, algo que deveria ter sido alvo de um esforço de prevenção importante. Os diferentes níveis de governo dizem que fizeram sua parte. O Ministério da Saúde, por exemplo, informa que enviou a São Paulo em 2014 mais de mil quilos de larvicida e 14 mil litros de inseticida para serem usados contra as larvas do Aedes Aegypti. E que no ano passado realizou o Levantamento Rápido do Índice de Infestação do Aedes (LIRA) em 1844 cidades. O índice revela os locais de maior concentração do mosquito e serve – ou pelo menos deveria servir – para nortear ações preventivas feitas pelos municípios dois ou três meses antes do período esperado para o surgimento de casos (janeiro a maio). Em São Paulo, a Secretaria Estadual da Saúde alega que desde o ano passado vinha alertando as prefeituras sobre o risco de aumento no número de casos em 2015 e que, entre outras medidas, destacou 500 agentes da Superintendência de Controle de Endemias para ajudar nos locais mais atingidos.

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Uma política contínua de prevenção, porém, deveria incluir o ataque a causas estruturais que estão por trás da repetição das epidemias por aqui. “Entre elas, a falta de saneamento e o processo de urbanização descontrolada”, explica a pesquisadora Denise Valle, do Instituto Oswaldo Cruz, do Rio de Janeiro. Além disso, é preciso investir na conscientização da população sobre a importância dos cuidados dentro de casa. Do ponto de vista mais imediato, o Ministério da Saúde coordena algumas iniciativas, como um estudo para validar sinais de alarme de que os casos podem aumentar em determinado local. “As epidemias normalmente pegam os gestores de surpresa, mas elas não ocorrem abruptamente”, explica Giovanini Coelho, coordenador do Programa Nacional de Controle da Dengue. “A partir de informações como a temperatura e a notificação de casos em uma área, é possível acionar os planos de contingência contra a doença naquele lugar”, diz. 

Fotos: TIAGO QUEIROZ/EST ADÃO; Divulgação; Francisco Cepeda /AgNews-SP