O movimento chamou a atenção dos brasileiros nesta temporada, quando o melhor jogador do Campeonato Brasileiro de 2014, Ricardo Goulart, deixou o Cruzeiro (MG) para jogar no Guangzhou Evergrande, o tetracampeão chinês, por R$ 48 milhões. E Goulart não foi sozinho nessa empreitada. Logo depois, o festejado atacante Diego Tardelli anunciou que estava deixando o Atlético Mineiro para jogar no Shandong Luneng, cujo técnico é seu amigo, o também brasileiro Cuca. Por trás dessas e de muitas outras transações – hoje 40% dos estrangeiros que atuam na China são brasileiros – está o indonésio naturalizado chinês Lee Yue Hung, 56 anos. Nenhum outro empresário oriental desfruta, no Brasil, da posição de Joseph Lee, como é conhecido entre cartolas e atletas.

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Patrocínio
Joseph Lee (acima) mora no País há 35 anos, é casado com uma brasileira
e torce para o São Paulo. Wang Jianlin (abaixo) é o segundo homem
mais rico da China, mecenas de futebol e amigo de Lee

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Lee tem um ótimo trânsito entre os mecenas chineses que, atualmente, patrocinam a expansão da Super Liga Chinesa (CSL). É homem de confiança, por exemplo, de Wang Jianlin, 60 anos, o segundo na lista dos mais ricos da China, 42º na da “Forbes”, dono de uma fortuna avaliada em R$ 49 bilhões. Filho de um veterano da Revolução Comunista, Jianlin trocou a farda do Exército chinês pelos ternos ao comprar uma imobiliária falida e fazer dela um megaconglomerado, o Dalian Wanda Group, que engloba desde lojas de departamento a hotéis. Dalian era o nome de um time de futebol do bilionário. “Wang era dono do time e virou meu amigo. Ele batia no meu ombro e dizia: ‘Leezinho, posso confiar no jogador que você está trazendo para cá?’”, diz Lee. Jianlin, que no final do ano passado adquiriu 20% do campeão espanhol Atlético de Madrid por R$ 140 milhões, injetou R$ 210 milhões na federação chinesa, em 2011, para dar nova vida ao futebol local, que andava desacreditado desde a década passada. Escândalos de corrupção, manipulação e venda de resultados levaram o esporte às páginas policiais. Cartolas, atletas e o único juiz chinês da história a apitar uma partida de Copa do Mundo foram parar atrás das grades. Se os bilionários estão financiando a construção do renovado futebol chinês, é Lee o arquiteto. Foi ele quem levou para o Oriente, além das estrelas Ricardo Goulart e Diego Tardelli, Wagner Love, já de volta, hoje no Corinthians, o argentino Conca (em 2011) e técnicos como Cuca e o campeão mundial pela Itália Marcelo Lippi.

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O chinês também convenceu o Real Madrid a mandar uma comissão técnica, dois anos atrás, à China para aplicar sua metodologia de treinamentos nas categorias de base do Guangzhou. No Brasil, fez o mesmo, no ano passado, com o São Paulo, que enviou profissionais para cuidar da escola de futebol do Shandong, time que dispõe de um CT para 300 alunos e 22 campos. “Lee é simpático, respeitoso. Muitos empresários não conseguem o mesmo sucesso dele na China”, diz Juvenal Juvêncio, ex-presidente do tricolor paulista. “De vez em quando, o Lee é chato”, diz, em tom de brincadeira, Cuca, técnico do Shandong. Campeão da Libertadores com o Atlético Mineiro, em 2013, ele se transferiu para a China no ano seguinte. “Quando o presidente do clube está insatisfeito com o desempenho de algum atleta, é ele quem vem conversar comigo”, conta Cuca.

Fluente em português, malaio, inglês e mandarim, Lee é muito discreto. Filho de um dentista que fabricava chocolate, papelão e espuma, ele mora em São Paulo há 35 anos e é casado com uma brasileira, com quem tem três filhos. No Brasil, antes de conquistar respeito com o futebol, abriu uma loja de carro e um restaurante. “A cultura aqui é mais aberta do que na Ásia, muito mais rígida”, diz o empresário, torcedor do São Paulo, que planeja ver seu negócio crescer ainda mais nas próximas temporadas. “A China se fortaleceu economicamente e tem a maior população do mundo. Entre 20% e 30% dos chineses gostam de futebol. Se fizermos essas pessoas irem para o campo, teremos a maior torcida do mundo.” Para Fernando Ferreira, diretor da Pluri Consultoria, especializada em negócios esportivos, em três anos o valor de mercado dos elencos que disputam o campeonato chinês irá ultrapassar o brasileiro. “Em 2011, a China estava na 60ª colocação entre os mercados mais valiosos do planeta. Hoje, é o 14º. O Brasil é o nono”, afirma. Com base nesses dados, não é para ninguém ficar surpreso com a voracidade com que os chineses têm contratado atletas do Brasil. Tudo sob a batuta de Joseph Lee.

Fotos: Tomohiro Ohsumi/Bloomberg; Jeff Zelevansky/Getty Images