06818652.jpg

O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira absolver o senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) das acusações de falsidade ideológica, peculato e corrupção passiva, referentes à época em que ele era presidente da República, entre 1990 e 1992. Na avaliação dos ministros, o Ministério Público Federal não conseguiu provar a culpa de Collor quanto aos crimes atribuídos a ele.

Collor foi denunciado pelo Ministério Público por envolvimento num suposto esquema de fraude em licitações e pagamento de propina.

Conforme a denúncia, empresários do setor de publicidade pagavam propina a auxiliares diretos do então presidente. Em troca, as empresas ganhavam contratos em concorrências direcionadas. Contas pessoais de Collor, como pagamento de mesada para um filho só depois reconhecido pelo presidente, eram quitadas com a arrecadação ilícita, citou a vice-procuradora-geral da República, Eli Wiecko.

De acordo com o advogado de Collor, Rogério Marcolini, que pediu a absolvição de Collor, as acusações feitas pelo Ministério Público carecem de provas materiais que liguem o ex-presidente aos fatos narrados na denúncia. Segundo a defesa, nenhuma das testemunhas sustentou a participação direta de Collor ou mesmo sua influência em supostos desvios de dinheiro.

"A denúncia não descreve nenhuma atividade de Collor, nenhum ato de ofício, seja no propósito de escolher as agências ou na fixação dos preços praticados. Tudo que a denúncia se limita a referir é que Collor comandava as operações do esquema por meio de um testa de ferro, que a própria relatora indicou que se trata de uma figura menor. Na leitura da denúncia, a única participação atribuída a Collor seria como de um manipulador de marionetes”, afirmou Marcolini.

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

A posição também foi defendida pela ministra Cármen Lúcia, relatora do processo, a acusação não conseguiu reunir provas de que Collor tivesse sido diretamente beneficiado pelo esquema. Apesar de as acusações não estarem ligadas diretamente ao impeachment do ex-presidente, elas também serviram de base ao processo político que culminou na cassação do mandato de Collor.

"Não se cuida de uma denúncia que possa ser tratada como primor de peça. Só tem domínio de fato quem tem conhecimento do fato. Os documentos não apresentam elementos de convicção suficientes para sustentar a responsabilidade penal do réu. Falta prova da materialidade e da autoria dos crimes que lhe foram imputados. Inexistem provas e indícios, o que impossibilita a condenação pleiteada”, votou a ministra.

O voto da relatora foi acompanhado por todos os ministros presentes, à exceção de Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello, que não participaram da sessão. Apesar de ter concordado com o entendimento de Cármen Lúcia, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, criticou o resultado do julgamento.

"No que diz respeito à acusação de peculato, os sócios da empresa de propaganda confirmaram, em um primeiro momento, que faziam trabalho em prol de sua imagem (Collor), em benefício direto a ele. Em um segundo momento, recuaram. Confirmaram também haver pago para obter a vitória nas licitações. Foram abertas contas de fantasmas que recebiam esses recursos. A mãe da criança, que posteriormente se revelou ser filho do ex-presidente, confirmou que recebeu os recursos por meio desses fantasmas. Há pelo menos mais do que indícios. O que falta é a relação direta dele, do ex-presidente, com aquela prova smoking gun, que o ligaria diretamente. De maneira que acho perfeitamente razoável a solução preconizada pela relatora da insuficiência das provas”, disse Barbosa.

Prescrição

O julgamento teve início já com a prescrição de duas das três acusações atribuídas a Collor, ou seja, o crime não poderia mais ser punido em razão do tempo decorrido dos fatos. A morosidade da Justiça foi a responsável por isso. A denúncia foi recebida pela Justiça comum em 2000 e chegou ao Supremo apenas em 2007, quando Collor assumiu o mandato de senador. Inicialmente, o processo estava sob a relatoria do ministro Menezes Direito, que morreu em 2009.

Em 2009, a relatora passou a ser a ministra Cármen Lúcia. O processo ficou quatro anos no gabinete de Cármen Lúcia, que justificou a demora na análise sustentando que o processo era longo e que precisou dar prioridade à ação do mensalão e à do ex-deputado federal Natan Donadon (PMDB-RO), que corriam maior risco de prescrição. 

Apenas em novembro de 2013, ela mandou para Dias Toffoli, revisor da ação penal. Ainda com o julgamento do mensalão em andamento, passaram-se mais cinco meses até que o processo fosse colocado na pauta de julgamento. O ministro Luís Roberto Barroso chegu a criticar a demora, tentando tirar a responsabilidade de Cármen Lúcia.

"Uma das áreas que eu acho que nós ainda não estamos conseguindo funcionar bem é a do sistema punitivo. No Brasil, entre truculência e impunidade, o grande traço constante tem sido a demora, a absoluta morosidade em que os processos tramitam. Punir alguém em 2014 por fatos ocorridos em 1991, na minha visão, seria quase como punir outra pessoa, passado tanto tempo”, disse o ministro.

Ao final do julgamento, Joaquim Barbosa foi questionado sobre a demora do julgamento e foi ainda mais incisivo. "Eu acho que isso é um retrato de como funciona a Justiça criminal brasileira”, atacou o presidente do STF.



Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias